“Eu entrei na Síria pela Turquia, no dia 22 de Setembro, com o propósito de chegar a Alepo, cidade onde a luta estava sendo travada. O plano era cobrir as batalhas ao longo das linhas de frente em uma área controlada pelo Exército de Libertação da Síria, na cidade sitiada.
Dois desertores do exército da Síria, agora ativistas rebeldes, eram meus contatos. Eu viveria com e seria guiado por eles pelas próximas duas semanas.
Ao entrar na cidade, o barulho dos bombardeios e ataques aéreos chegaram rapidamente aos meus ouvidos, e a fumaça dos telhados engolfava toda a linha do horizonte. Fiquei surpreso ao constatar que o cotidiano daquelas pessoas continuava normalmente, em meio a fortes explosões de um bombardeio mortal.
Os sírios que decidiram permanecer na cidade escolheram uma vida de medo e pesar enquanto sua família, amigos e vizinhos, são mortos e feridos durante a campanha militar do Presidente Bashar al-Assad, na tentativa de recuperar o controle de Alepo.
“O que você quer que façamos? Que deixemos nossas casas e corramos para a Turquia? Eu prefiro viver em minha casa a viver em condições miseráveis como um refugiado”, diz Ahmed, dono de uma loja nas vizinhanças de Sai Al Dowle, enquanto eu andava em direção a posição de luta do FSA (Free Syria Army).
Eu entrei em Dar Al Chifa, um dos hospitais remanescentes em Alepo. Todo o chão estava coberto por enormes poças de sangue.
Havia um sentimento de desespero e medo. Os gemidos dos feridos e os choros das crianças nos cercavam.
Um dos médicos me disse que o governo sírio deliberadamente mira nos civis. Ele quer assustar a população de Alepo para que não apóiem o Exercito de Libertação da Síria.
Andei pelos escombros da cidade […] Do outro lado, o grupo dos soldados do FSA estavam preparando-se para a batalha.
Um jovem soldado me abordou: “Bem-vindo, bem-vindo, não tenha medo. Agora nós iremos lutar. Nós lutamos por nossas famílias e por nossos amigos. Nós lutamos porque não há nada que nos resta fazer além de lutar.”
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O trecho alarmante e comovente provém de um curto documentário do fotógrafo Sebastiano Piccolomini, que apresenta, também através de fotos, a realidade de um dos países envolvidos na chamada Primavera Árabe: a Síria.
A Síria, influenciada por protestos simultâneos no mundo árabe, passa por uma Guerra Civil que progrediu para uma violenta revolta armada. A luta visa a destituição do Presidente Bashar Al-Assad e a implantação de uma liderança política mais democrática.
A série fotográfica de Sebastiano Piccolomini mostra a força das mulheres sírias, que, em meio a anos incessantes de massacre, decidiram participar ativamente da luta para defender sua família e seus amigos; em um país com uma alta taxa de estupros e com uma tradição que impõe o uso dos véus. Algumas mulheres, ainda de Niqab (véu conservador que deixa à mostra apenas os olhos) mostram seu lado revolucionário e determinado no impactante ensaio que se segue.
“Que escolha nós temos?” – Rana, estudante de 20 anos, membro da única unidade de luta composta apenas por mulheres no Exército de Libertação da Síria.
“Minha casa em Dar’a foi destruída por duas bombas… Mudei-me para Alepo com minha família, e escolhi pegar uma arma e lutar contra o regime. – Om Ahmad, 72 anos de idade, dona de casa e mãe de 3 filhos.
“O Ocidente não vê problema algum na Síria, e, enquanto imploramos por ajuda, nossas crianças, amigos e famílias estão sendo punidos sem motivo algum.” – Ali, estudante de 16 anos.
“Ser abusada por um guarda de segurança do regime na frente do meu marido foi a coisa mais humilhante que já aconteceu com a minha família. Eu peguei uma arma e entrei para a luta.” – Om Faraj, 30 anos, dona-de-casa sem filhos.
“Meu marido morreu na linha de frente. Eu morrerei na linha de frente.” – Fadwa, 20 anos, viúva e mãe de 3 crianças.
“Me sinto otimista. Nós derrotaremos o regime e poremos um fim a pobreza e aos maus tratos.” – Khansa, 42 anos, dona de casa e mãe de 7 crianças.
“Eu luto pela vida e pela liberdade, eu luto para provar que homens e mulheres são iguais.” – Benifet Ikhala, viúva de 27 anos e mãe de 6 crianças.
Revisor: Pedro Dalboni
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