Mostrando postagens com marcador Mundo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Mundo. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 21 de março de 2025

Os negócios suspeitos de Eduardo Bolsonaro nos EUA

 

Eduardo Bolsonaro e Donald Trump: o deputado fundou, há mais de um ano, uma empresa em Arlington, Texas, para onde fugiu nos últimos dias. Foto: Reprodução

FONTE: Site DCM

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL) anunciou que vai se licenciar “temporariamente” do mandato na Câmara dos Deputados e passar um período nos EUA por conta de “perseguição política no Brasil”, mas, aparentemente, são seus “negócios suspeitos” que o levaram de volta para lá.

Na última quinta-feira (20), Eduardo formalizou o pedido de licença, incluindo dois dias por “tratamento de saúde” e mais 120 dias para tratar de “interesses particulares”. Como o afastamento excede 120 dias, seu suplente será convocado para ocupar a vaga durante o período.

Em 18 de março de 2023, o “bananinha” fundou a empresa Braz Global Holding LLC. A companhia foi criada em sociedade com o influenciador Paulo Generoso e com André Porciúncula, ex-secretário nacional de Fomento e Incentivo à Cultura durante o governo Bolsonaro.

Ambos os sócios são ligados à disseminação de fake news no Brasil, apoiaram os atos terroristas de 8 de janeiro e integraram a gestão do ex-presidente. A empresa foi registrada no endereço residencial de Generoso, onde outras duas companhias também foram abertas, mas sem Eduardo como sócio direto.

Questionado na época sobre as atividades da empresa, Eduardo Bolsonaro afirmou: “Não tem nada demais. Explicar o quê? Estou devendo alguma coisa?”. E completou: “Eu estou traficando droga? Eu estou roubando alguém? É corrupção?”

Braz Global Holding

A Braz Global Holding não apresenta, nos registros do Texas, qualquer informação clara sobre seu ramo de atuação. No mesmo endereço, Paulo Generoso também fundou a Liber Group Brasil, em 13 de janeiro de 2023, e o Instituto Liberdade, em 8 de fevereiro. Nessas duas empresas, os responsáveis oficiais são Generoso, Porciúncula e Raquel Brugnera, ex-servidora do governo Bolsonaro.

Raquel Brugnera e Paulo Generoso foram os criadores do Movimento República de Curitiba, em 2016, que apoiava a Operação Lava Jato e atuou nas campanhas de Jair Bolsonaro em 2018 e 2022.

Paulo Generoso e Eduardo Bolsonaro fundaram a Braz Global Holding LLC em Arlington, Texas. Foto: Reprodução

A página do movimento no Facebook soma 1,2 milhão de seguidores e já espalhou notícias falsas sobre urnas eletrônicas, a pandemia de Covid-19 e os atos golpistas. Generoso teve a conta no Twitter suspensa em janeiro de 2023 por decisão judicial, conforme registrado pela plataforma.

Em paralelo, Porciúncula abriu, em março de 2023, a empresa Spalla Consultoria, Marketing e Publicidade Ltda, sediada em Brasília, no Centro Empresarial Brasil 21, quatro andares abaixo da sede nacional do Partido Liberal.

Raquel Brugnera, apesar de não ser sócia direta de Eduardo Bolsonaro, aparece conectada a ele por meio das duas empresas criadas com Generoso no mesmo endereço da Braz Global Holding, em um curto intervalo de tempo. Ambas as companhias não têm descrição pública de suas atividades, mas os nomes dos diretores confirmam o elo com figuras do bolsonarismo.

quinta-feira, 13 de março de 2025

JUIZA LIBERTA 114 DETIDOS EM MARCHA DOS APOSENTADOS E É ATACADA PELO GOVERNO MILEI

Victor Farinelli 

El Destape - Polícia argentina prendeu mais de 150 pessoas durante repressão à Marcha dos Aposentados

A Justiça argentina determinou nesta quinta-feira (13/03) a libertação de 84 homens e 30 mulheres que foram presos pelas forças de segurança do país durante a chamada Marcha dos Aposentados, realizada no dia anterior, na qual dezenas de milhares de pessoas protestaram contra os cortes de verbas para a previdência social durante o governo do presidente Javier Milei.

A decisão foi assinada pela juíza Karina Andrade, titular do Juizado Penal N° 15 de Buenos Aires, que avaliou os boletins policiais entregues sobre as prisões e considerou que, em 114 dos mais de 150 casos apresentados, “não foi comprovado delito que justificasse a detenção”.

“Tendo em vista o entendimento de que não houve o estrito cumprimento do disposto no artigo 164 do Código Penal, somado ao fato de que o Ministério Público não se manifestou sobre essas prisões, foi solicitada a imediata cessação de todas e cada uma delas, por serem consideradas arbitrárias”, diz o texto da decisão.

A magistrada argentina acrescentou que “atendendo ao pedido da defesa, analisei as informações prestadas e entendo que, com relação às prisões relatadas, está em jogo um direito constitucional fundamental: o direito de protestar, de se manifestar em uma democracia, o direito à liberdade de expressão”.

Vale registrar também que o protesto terminou com dezenas de pessoas feridas, nove delas com ferimentos na cabeça e em estado grave. Os dois casos de maior risco vital são os de Beatriz Blanco, uma senhora de 87 anos que foi jogada no chão por um policial, e o de Pablo Grillo, um fotojornalista que recebeu estilhaços de uma bomba de gás lacrimogêneo que explodiu perto da sua cabeça, após ser lançada pelas forças de segurança.

Ataques do governo

Em resposta à decisão da Justiça, o governo de extrema direita de Javier Milei iniciou uma campanha de ataques contra a magistrada que determinou a libertação dos 114 detidos durante a marcha.

O primeiro a criticá-la foi o ministro porta-voz da Presidência, Manuel Adorni, através de uma declaração nas redes sociais na qual acusa a juíza de ser uma “militante da impunidade”.

“A juíza Karina Giselle Andrade deu a ordem para libertar os 114 detidos que, junto a muitos outros, destruíram ontem a cidade de Buenos Aires e atacaram as forças de segurança. A Justiça da porta giratória é diretamente responsável pela insegurança na Argentina”, afirmou Adorni.

O ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona, anunciou que a juíza Karina Andrade “terá sua atuação avaliada pelo Conselho da Magistratura de Buenos Aires, por possível incumprimento das suas funções”.

Já a ministra de Segurança Nacional, Patricia Bullrich, justificou as prisões dizendo que “os que foram detidos eram grevistas violentos, militantes de partidos de esquerda e barras bravas, que são membros de organizações criminosas que operam com total impunidade há anos”.

Com informações: El Destape


Com informações de El Destape e Página/12.

segunda-feira, 3 de março de 2025

Lula comemora vitória histórica de ‘Ainda Estou Aqui’ no Oscar: ‘Orgulho do nosso cinema e da nossa democracia’

Presidente se pronunciou pelas redes sociais, bem como a primeira dama Janja; Ministério da Cultura e Itamaraty divulgaram nota destacando luta por justiça para crimes da ditadura militar

brasil de Fato


O governo brasileiro celebrou a premiação do filme Ainda estou aqui, do diretor Walter Salles, como melhor filme internacional, na noite de domingo (2). O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), usou as redes sociais para cumprimentar os envolvidos na produção.

“Hoje é o dia de sentir ainda mais orgulho de ser brasileiro. Orgulho do nosso cinema, dos nossos artistas e, principalmente, orgulho da nossa democracia. Eu e Janja estamos muito felizes assistindo tudo ao vivo”, escreveu Lula na rede X. “O Oscar de Melhor Filme Internacional para Ainda Estou Aqui é o reconhecimento do trabalho de Walter Salles e toda equipe, de Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, Selton Mello, do Marcelo Rubens Paiva e família e todos os envolvidos nessa extraordinária obra que mostrou ao Brasil e ao mundo a importância da luta contra o autoritarismo. Parabéns! Viva o cinema brasileiro, viva Ainda Estou Aqui”, postou.

Em uma outra postagem, Lula felicitou a atriz Fernanda Torres pela campanha do filme e por sua atuação como Eunice Paiva na produção. “Querida Fernanda, você honrou o Brasil com sua brilhante atuação em Ainda Estou Aqui e encantou o mundo todo vivendo a grande Eunice Paiva. Receba um abraço e um beijo carinhoso meu e da Janja”, publicou o presidente.

Por sua vez, a primeira-dama Janja Silva fez seu próprio pronunciamento atrávez de sua conta no Instagram. “Em tempos de tanto ódio e autoritarismo, Ainda Estou Aqui vem para nos lembrar de momentos que não queremos viver nunca mais”, escreveu. “Viva Eunice Paiva, essa mulher brilhante que defendeu sua família e a memória de seu marido até o fim! Viva Fernanda Torres, que interpretou de maneira excepcional a história de Eunice (no coração das brasileiras e brasileiros, o prêmio é seu!!!). Viva Fernanda Montenegro, Walter Salles, Marcelo Rubens Paiva, Selton Mello e toda a produção e elenco do filme. Parabéns, vocês brilharam!!!”, publicou a primeira-dama.

A futura ministra das Relações Institucionais da Presidência, Gleisi Hoffmann, pediu desculpas por não poder conter o clima de copa do mundo em torno da premiação do filme brasileiro. “Desculpa pessoal, mas teve clima de Copa do Mundo sim! E teve taça! Parabéns, Walter Salles! Que incrível a trajetória de sucesso do filme Ainda Estou Aqui. E num momento tão delicado, onde a nossa democracia mais esteve em perigo. Viva a cultura brasileira!”.

Do mesmo modo, o líder do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara dos Deputados, Lindbergh Farias (PR-RJ), postou um vídeo ao lado de Hoffmann, com quem se relaciona, e aproveitou para defender que não haja anistia às pessoas que participaram da tentativa de golpe de Estado no Brasil, entre 2022 e 2023. “Viva o Brasil. Viva o cinema brasileiro. Viva a democracia. Momento histórico! Ainda estamos aqui! SEM ANISTIA!”, escreveu.

Ministérios comemoram

Ministério das Ministério das Relações Exteriores (MRE) e o Ministério da Cultura (MinC) também divulgaram nota em que felicitam Salles pelo prêmio de Melhor Filme Internacional e Torres pela inédita indicação como Melhor Atriz na premiação mais importante do cinema internacional.

“Primeiro filme indicado pelo Brasil a vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional, Ainda Estou Aqui retrata a vida da advogada e ativista brasileira Eunice Paiva, reconhecida líder na defesa dos direitos humanos, da democracia e do direito à memória, à verdade e à justiça. O filme resgata a história da resistência e da luta por justiça para crimes cometidos durante a ditadura militar”, diz o comunicado.

“A premiação atesta a excelência do cinema brasileiro, ampliando sua projeção no cenário internacional. Além disso, reforça o indispensável papel da cultura como instrumento de memória e reflexão, destacando a importância da proteção e da promoção dos direitos humanos e da democracia como valores inegociáveis da sociedade brasileira”, conclui o texto.



quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Com a cabeça na lua e os pés na soja | (breve balanço de meio mandato do governo Lula; política externa)

 Por Rui Abreu

FOTO:  Ricardo Stcukert

            Lula assumiu a presidência do Brasil em 2023 a meio de um conflito global que coloca os E.U.A. contra qualquer país que não assuma os interesses estadunidenses como primordiais, a guerra que confronta o império norte americano com a sua perda de hegemonia global.

            Com a China a encabeçar o campo contra hegemônico e os BRICS como instrumento de construção econômica de superação do domínio imperialista, o estreitamento de relações dentro do Sul Global apresentava-se para o Brasil como perspectiva alternativa ao destino de eterna colônia dos EUA e das potências europeias. É neste contexto bipolarizado que o governo em disputa de Lula começa sua governação tendo para responder os anseios da esquerda de desenvolver e qualificar a economia; e o lucro confortável agroextrativista e da finança defendido pela direita e extrema direita. Este binômio apresenta-se determinante para as relações internacionais e o papel do Brasil no mundo.

            A casa branca do partido democrata aproximou-se de Lula através dum inimigo que tinha colocado os governos de Biden e Lula e o pacto liberal burguês que os sustentava em risco. Mas nem o enfrentamento comum ao neofascismo conseguiu apagar o rasto golpista da CIA que Snowden ¹ e a vazajato denunciaram e que tornou clara a participação dos EUA no golpe continuado de 2016, passagem que a consciência anti imperialista não esquece.

            Já a China continuava (e continua) seu caminho de predominância comercial, desembarcando em todos os continentes com sua pujante diplomacia econômica. Com um modelo de negócio circular, em que domina todas as fases do ciclo desde o projeto ao financiamento, a China estabeleceu-se como a maior força econômica do mundo, sendo a principal parceira comercial de mais de 120 países. Para tal serviu-se do projeto Cinturão e Rota, em que o Cinturão representa as novas rotas terrestres que acessam a Europa, Sul e Sudeste Asiático e a Rota representa a rede marítima que conecta a produção chinesa com os principais portos da Ásia, América do Sul, África e a Europa. Os resultados já estão à vista estando expectado na balança comercial chinesa para 2024 um superavit de 1 trilhão de dólares. A maioria das infraestruturas foram e são projetadas, construídas e financiadas pela China, colocando o esforço inicial sobre o gigante asiático, mas também garantindo um total controle dos projetos.

 

Subindo a rampa com Joe de um lado e Xi do outro

 

            Sob nova liderança o Brasil tentaria ocupar um lugar de destaque na nova ordem mundial a construir, tentando recuperar a política externa ativa e altiva que Celso Amorim ampliou e que promoveu o Brasil no mundo no início do século XXI. Pelo menos essa era a expectativa, ainda mais inflada pelo discurso (correto) de desdolarização do presidente Lula.

            No entanto, desde o início do mandato os sinais do executivo foram contraditórios, recusando em janeiro o pedido de envio de armas e munições para a Ucrânia feito pelos governos alemão e francês enquanto votava em fevereiro nas Nações Unidas a resolução patrocinada pelos EUA que tentava isolar a Rússia no cenário internacional.

            Dava-se início a um percurso ziguezaguiante que projetava o Brasil como um “não alinhado” de grande dimensão política e econômica, podendo colher frutos de todos os lados. Um caminho trilhado no passado mas num contexto muito diferente do atual, em que a pressão imperialista dos EUA vem bipolarizando o mundo entre os submissos aos seus interesses e os que tentam um desenvolvimento autônomo e soberano. Um contexto de bipolarização catalisado pela guerra na Ucrânia, com o império instando os países a tomar posição no seu campo ou no campo oposto, o anti imperialista, este último difuso e de países com sistemas diferentes mas alinhados em superar a hegemonia norte americana no mundo.

            Sobre a guerra na Ucrânia, a posição do governo Lula oscilou entre a condenação da incursão russa em território ucraniano e a compreensão histórica e política das razões da Rússia. Na prática acabou por não se alinhar com o bloco ocidental na condenação e tentativa de isolamento econômico e político da Rússia, não promovendo russofobia, não chancelando as sanções econômicas impostas por Biden e seus lacaios europeus, não participando do esforço de guerra que o império impõe a seus súditos e continuando suas relações econômicas normais com a Rússia. E fez bem! Em 2024, pela primeira vez na história a Rússia ascendeu ao top 10 dos parceiros comerciais do Brasil.

            Também China e EUA aumentaram suas relações econômicas e comerciais com o Brasil, sendo o primeiro e segundo parceiros respectivamente. Não obstante fossem anunciados acordos de cooperação e desenvolvimento de setores da economia quer com os EUA quer com a China, a balança comercial brasileira continua ser maioritariamente preenchida nas exportações por:

 

Produtos agrícolas: café, soja, açúcar, carne bovina, frutas e verduras;

Produtos minerais: minério de ferro e petróleo;

Produtos industriais: combustíveis de petróleo, petróleo bruto, café, celulose e aeronaves.

 

Enquanto as importações são maioritariamente:

Produtos petrolíferos refinados, óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos; Produtos de tecnologia: equipamentos de informática, equipamentos de telecomunicações, sistemas de energia e maquinário industrial;

Produtos industriais: equipamentos médicos, produtos farmacêuticos e medicamentos.

 

            Ambas as potências retiram da economia brasileira o que mais precisam e o que o modelo econômico agroextrativista tem para colocar no mercado internacional não se divisando nessas relações substantivos desenvolvimentos no tecido industrial brasileiro, mas essa é uma encruzilhada a resolver dentro do Brasil.

            Mas... em tempos de bipolarização global o caminho em cima do muro torna-se estreito e de curta duração, havendo obstáculos impossíveis de ultrapassar.

 

BRICS e o caso Venezuela

 

            Primeiramente em 2009 com China, Rússia, Brasil e Índia, acompanhados em 2011 pela África do Sul, a criação dos BRICS viria a contribuir e destacar o deslocamento do centro econômico atlantista para a Ásia/Pacífico e o que se viria a convencionar como Sul Global. O patrocínio do Brasil ao projeto no início da década passada e os discursos entusiásticos do presidente Lula em 2023 auguravam um aprofundamento do projeto, podendo vir a ser um caminho alternativo às relações coloniais estabelecidas entre o império estadunidense/europeu e o Brasil.

            A incursão da Rússia na Ucrânia serviu de motivo para os EUA quebrarem os circuitos econômicos globais que no seu pleno funcionamento só aumentam a distância de crescimento e desenvolvimento da economia chinesa em relação à estadunidense. Impuseram sanções, roubaram reservas financeiras russas no exterior e estabeleceram fortes restrições no relacionamento com a Rússia. Economia e dólar seriam agora instrumentos cada vez mais bélicos, com objetivos muito mais destrutivos que construtivos, ameaças essas que o resto do mundo bem compreendeu, havendo um movimento de abandono do dólar como unidade das reservas de muitos países.

            A pressão imposta pelas armas e pela ditadura do dólar no comércio mundial levou muitos países a encarar os BRICS como um caminho econômico alternativo às relações extorsionistas do (em declínio mas ainda) império com o resto do mundo, mesmo sendo um grupo de países com modelos políticos e sociais muito diferentes. Neste cenário dezenas de países tentam a adesão ao grupo, tendo sido aprovada em 2024 a extensão para mais cinco países: Irã, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e a Arábia Saudita.

            Foi neste ímpeto aglutinador que a Rússia propôs a Venezuela como novo parceiro do grupo e o Brasil vetou, dando continuidade à pior falha que teve na política externa. A mando não se sabe de quem (mas calcula-se), o Brasil assumiu um papel de fiscalizador de eleições alheias, (mas só da Venezuela) não reconhecendo a legalidade do ato mesmo quando a corte eleitoral venezuelana o fez. Violando despudoradamente a soberania de um país vizinho, parceiro econômico e indispensável para a integração sul americana, que ficou mais fragilizada com esta atitude do governo brasileiro. Recordando que o projeto de envolvimento dos países sul americanos pode ser mais um mecanismo de defesa e emancipação do continente face às potências que sempre o colonizaram, em particular do domínio do Tio Sam.

            Ao final de dois anos de mandato vemos um Brasil pouco comprometido com o aprofundamento dos BRICS, agora na sua versão PLUS, e com a integração sul americana, dando o governo mais destaque nas suas relações com o bloco imperialista, como no encontro do G20 e as negociações do acordo UE/Mercosul. Esperemos que haja uma recondução na política externa brasileira, recuperando fulgor dentro dos BRICSPLUS e normalizando suas relações com a Venezuela, movimento racional e necessário.

 

Palestina viva e livre!

 

            O mundo vai assistindo de forma plácida o genocídio em Gaza promovido pelo governo sionista israelense e patrocinado pelos EUA acompanhados pela maioria dos governos europeus. Também China e Rússia têm assobiado para o lado.

            Lula acertou ao classificar por várias vezes como genocídio o que o é. Embora sem sequência efetiva no campo diplomático e econômico, as falas corajosas de Lula sobre o massacre em Gaza deram relevância e alento à causa palestina e revelou ser o melhor contributo que o governo brasileiro deu nos últimos dois anos. Esperemos que se desenvolvam novas formas de defesa e solidariedade para com a Palestina entendendo que combater o sionismo é tarefa mundial ao nível de cada país. Não só o sionismo está disseminado pelo globo como se emparelha com movimentos/ideologias irmãs como o neofascismo e o neonazismo.

            Combater o genocídio sionista também é combater a extrema direita dentro de casa.

 

Com a cabeça na lua e os pés na soja

 

            Os programas espaciais são talvez a maior forma de afirmação como potências que os países têm no cenário internacional. O século XXI viu recrudescer a exploração espacial com vários novos atores a disputar o palco estelar. O nosso astro inquilino ganhou particular atração nos últimos vinte anos, tendo Israel, Rússia e Índia tentado alunagens com mais ou menos sucesso.       Mas são as duas superpotências que estão mais avançadas nos seus programas de exploração espacial, revelando-se a China a que mais passo deu no seu projeto de criação da Estação Internacional de Investigação Lunar. Afinal tudo acompanha a economia... Em resposta a este projeto, os EUA desenvolvem o programa ARTEMIS que pretende recolocar seres humanos na superfície do satélite terrestre.

            Também estes programas refletem o posicionamento das potências e suas diplomacias. Através da emenda Wolf, de 2011, o congresso norte americano proibiu o financiamento de qualquer programa que tenha o envolvimento de cientistas estadunidenses com projetos espaciais chineses e vice versa. Há mais de uma década que o império encara como um problema vital a ascensão chinesa. Por seu turno, o programa espacial chinês continua aberto à participação de todos os países sem excepção, consolidando o gigante asiático como a potência colaborativa sem medo de concorrência, segura de sua predominância econômica e tecnológica, fazendo lembrar a segurança dos EUA quanto à globalização no início deste milênio. Os astros rodam e a vida também.

            O Brasil poderia estar neste grupo seleto de países com capacidade de exploração espacial, aproveitando os projetos internacionais liderados pelas superpotências. Mas uma breve consulta no site da Agência Espacial Brasileira ² constatamos que na cooperação internacional com EUA e China o Brasil não tem nenhuma atividade desde 2016. Seria coincidência? Claro que não. 2016 é o ano do golpe que reconduziu o Brasil a um modelo exclusivo de agro extrativismo financeirizado deixando o investimento em tecnologia e investigação no passado.

            Como referido em abril de 2023 em “O magnetismo imperialista” ³, a política de alianças, parcerias e enfrentamentos internacionais dependeria mais da situação interna do Brasil que das suas relações com o exterior, constando no capítulo “O amigo externo não faz milagres” que a China ou qualquer outro país só vai comprar o que o Brasil tiver para vender e que não será nenhum outro país a dar um rumo desenvolvimentista ao Brasil.

            Portanto, a questão da política internacional brasileira prende-se com o modelo de desenvolvimento econômico escolhido pelos/as brasileiros/as, sendo certo que se a relação de forças for alterada e o Brasil optar por um caminho de qualificação econômica e laboral, soberano e autônomo, sendo uma referência de desenvolvimento econômico e social, saindo do papel de eterna colônia exportadora de commodities, só um dos campos está disponível para o acolher, e não é o campo do império.

 

         

 

Notas e referências:

 

¹ Edward Snowden trabalhou numa empresa terceirizada da NSA e denunciou em 2013 o sistema de vigilância em massa feito pelo governo estadounidense sobre cidadãos/ãs nacionais e internacionais. Figuras como Dilma Rousseff e Angela Merkel foram vítimas dessa vigilância assim como empresas estratégicas como a Petrobras. Acabou por se refugiar na Rússia no mesmo ano onde recebeu cidadania.

 

² https://www.gov.br/aeb/pt-br/programa-espacial-brasileiro/cooperacao-internacional

 

³ https://www.brasil247.com/blog/o-magnetismo-imperialista

 

. https://www.wilsoncenter.org/blog-post/china-top-trading-partner-more-120-countries#:~:text=China%20is%20the%20top%20trading%20partner%20to%20more,is%20also%20the%20top%20trader%20with%20Russia%E2%80%94and%20Ukraine.

 

. https://emix.com.br/balanca-comercial-2022/

domingo, 17 de novembro de 2024

Xi Jinping defende que Brasil e China caminhem juntos e aprofundem parceria estratégica

 

Líder chinês ressalta cooperação em múltiplas áreas e propõe reformas no FMI, Banco Mundial e OMC

FONTE: Site Brasil 247

Xi Jinping e Lula (Foto: Presidência da República)


Em ARTIGO para a imprensa brasileira, o presidente da China, Xi Jinping, antecipou os temas que pautarão sua visita de Estado ao Brasil, a convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e sua participação na Cúpula de Líderes do G20, no Rio de Janeiro. Xi destacou a importância da parceria estratégica entre os dois países, celebrando o marco de 50 anos de relações diplomáticas, e propôs um reforço na cooperação bilateral e na reforma de instituições globais, como o FMI, o Banco Mundial e a OMC.

Xi Jinping rememorou o histórico da relação sino-brasileira, destacando como os primeiros intercâmbios comerciais, marcados pela chegada de chá e especiarias chinesas ao Brasil há mais de 200 anos, deram início a uma duradoura amizade entre as duas nações. “As relações diplomáticas China-Brasil, estabelecidas em 15 de agosto de 1974, têm resistido às mudanças e turbulências internacionais e são cada vez mais maduras e dinâmicas”, sublinhou o líder chinês.

O presidente da China enfatizou que os dois países mantêm uma relação pautada pelo respeito mútuo, igualdade e compreensão, com o Brasil sendo o primeiro país da América Latina a estabelecer uma parceria estratégica com Pequim. Essa aliança, segundo ele, serviu como um exemplo de cooperação entre países em desenvolvimento e fortaleceu os laços bilaterais em setores como agricultura, infraestrutura, energia e desenvolvimento sustentável.

Xi também destacou a rica interação cultural e os intercâmbios entre os povos. Ele mencionou figuras icônicas da literatura brasileira, como Cecília Meireles e Machado de Assis, que traduziram poesia da dinastia Tang, como símbolos de uma “sinfonia mental” que transcende o tempo e as fronteiras. Além disso, o presidente chinês lembrou que elementos culturais de ambos os países, como o samba e as capivaras do Brasil, e as festividades tradicionais chinesas, têm fortalecido o entendimento e a amizade entre as duas nações.

Desafios globais e cooperação estratégica

Xi Jinping apontou para a necessidade de uma colaboração mais profunda para enfrentar os desafios globais contemporâneos. Ele ressaltou o papel de Brasil e China como líderes do Sul Global, responsáveis por promover a multipolarização e a democratização das relações internacionais. Em sua visão, essa colaboração pode injetar “energia positiva à paz e à estabilidade mundiais”.

O presidente chinês propôs, ainda, que a parceria sino-brasileira busque uma sinergia estratégica entre a Iniciativa Cinturão e Rota e os planos de desenvolvimento do Brasil. Segundo Xi, essa colaboração poderá trazer benefícios duradouros e criar projetos exemplares para ambos os países e suas regiões.

Em um contexto de transformações globais sem precedentes, Xi Jinping defendeu a reforma de instituições internacionais como o FMI, o Banco Mundial e a OMC. Para ele, é necessário que essas entidades sejam mais inclusivas e representativas do Sul Global. Ele destacou que o G20 deve ser uma plataforma de cooperação que priorize o desenvolvimento sustentável e ofereça apoio efetivo aos países em desenvolvimento.

Sustentabilidade e combate à pobreza

Xi também elogiou a escolha do presidente Lula de priorizar o combate à fome e à pobreza na agenda da cúpula do G20 e manifestou apoio à proposta de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Ele lembrou a importância de um desenvolvimento sustentável e defendeu a continuidade do legado da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio em 1992.

O presidente Xi Jinping concluiu seu artigo reiterando a importância da colaboração estreita entre Brasil e China para enfrentar os desafios do futuro e fortalecer os laços históricos. Ele manifestou otimismo quanto à Cúpula do G20, acreditando que será um marco para ambos os países e para o mundo. “Espero que a cúpula possa injetar maior vigor e confiança ao desenvolvimento sustentável global”, afirmou Xi, mirando uma nova era de parceria estratégica que beneficie os dois países e promova um futuro mais justo e próspero.


sábado, 16 de novembro de 2024

Porque corre Trump?

 por Rui Abreu



Passados dez dias das eleições presidenciais estadunidenses e ainda com alguns

estados a terminar o apuramento, é já incontornável a retumbante vitória de Donald Trump.

Trezentos e doze grandes eleitores, cinquenta e três senadores, setenta e cinco milhões de

votos (vitória no voto popular), vinte e sete governadores e seis juízes da Suprema Corte dos

Estados Unidos nomeados por republicanos; são alguns dos números da nova legitimidade

institucional e política que sustenta Trump neste novo ciclo político.

Depois de ter perdido sua reeleição em 2020, como o povo devolveu a confiança política

a um ex presidente que atentou contra direitos básicos das mulheres, da população imigrante,

que tem dezenas de processos contra si no judiciário (onde tem até várias condenações) e que

contribuiu para a morte evitável de centenas de milhar de cidadãs e cidadãos durante a

pandemia do covid? Afinal, porque corre Trump?


1 – Neoliberalismo é seu nome

A chegada de Reagan ao poder em 1979 trouxe um aprofundamento do capitalismo num

formato neoliberal que colocou o estado totalmente a serviço do grande capital, em particular

do capital financeiro. Reduziu a capacidade de dinamização económica do estado em cenários

recessivos, entregou aos privados setores estratégicos da economia, cortou os programas de

apoio social, desmantelou as leis trabalhistas e as organizações de defesa da classe

trabalhadora; rebaixou as condições de vida da população colocando a classe trabalhadora

numa maior desproteção social, criou mecanismos de roubo do orçamento federal através da

dívida pública. Foi dentro desta composição económica e social que o P.I.B. norte americano se

multiplicou por nove, crescendo de três trilhões de dólares para vinte sete trilhões nestes

últimos quarenta e cinco anos.

Setorialmente os E.U.A. lideraram mundialmente transformações importantes na

economia em torno duma globalização que alimentava as taxas de lucro das suas

megacorporações. As Bigtech(s), então em crescimento, implantaram a economia digital, a

indústria deslocalizou-se para sul e oriente em busca de fatores de produção mais baratos, com

destaque para a mão de obra. O capital financeiro ocupou parcelas cada vez maiores da

economia, secundarizando o papel do estado como agente dinamizador e subjugando os

setores primário e secundário à lógica e prática da capitalização financeira.

A condição da classe trabalhadora ia acompanhando essas mudanças estruturais

económicas, sendo empurrada para a precariedade sem que sindicatos e comissões de

trabalhadores tivessem capacidade de resistência às alterações nas relações de produção que

o neoliberalismo impunha. O salário real foi desfalecendo, encontrando-se atualmente pouco

acima dos valores de 1980, retirando do fator trabalho a partilha da imensa riqueza criada nos

últimos quarenta e cinco anos. Tudo com a complacência da esquerda, que no centro do

império foi (e é) quase inexistente em termos organizados e não quis dar respostas às

dificuldades impostas ao povo. Este quadro económico neoliberal norte americano foi replicado

pelas economias ocidentais, dando origem a conjunturas semelhantes de intensa acumulação

de capital e empobrecimento generalizado da população na Europa e restante América.

É neste contexto que surge Trump e ressurgem os movimentos de extrema direita para

coletar apoio no estado de desesperança da população trabalhadora que não vê neste sistema

neoliberal a melhoria de suas condições de vida, tendo garantido para si e para as gerações

vindouras condições de vida piores que de seus pais, identificando na esquerda (normalmente

anémica de proposta) uma parte integrante do sistema. Um sistema capitalista que despeja

suas crises em cima de quem trabalha com ajustes fiscais cada vez mais draconianos

sustentados numa ideologia que individualiza os problemas e soluções, a qual não sofreu o

devido contraditório no debate e na proposta pela esquerda nas últimas décadas. A luta de

classes não esgrimida dos dois lados cria campo fértil para a extrema direita e condições para

a contínua degradação das condições de vida duma classe trabalhadora cada vez mais

politizada pelo neoliberalismo e neofascismo. Sem alternativa de esquerda e com perspetivas


de luta limitadas, os “trumpismos” surgem como catalisadores do descontentamento geral,

sendo a opção política que mais aparenta mudar o atual estado de coisas.


2 – A economia de Biden

Os indicadores liberais apresentam uma economia em recuperação no final do mandato

de Biden. A inflação, refletindo o corte de circuitos económicos com a guerra na Ucrânia

atingido 9.1% em junho de 2022 (sendo a maior dos últimos quarenta anos), situava-se em

setembro deste ano nos 2,4%. Também a taxa de desemprego acomodou-se entre os 3,8% e

os 5%, durante o mandato democrata, sendo considerada pelos analistas liberais como uma

situação de pleno emprego. O P.I.B. cresceu 6,1% em 2021 gozando do crescimento negativo

de -2,2% de 2020 provocada pelo impacto da pandemia da covid, de 2022 a 2024 cresceu

entre 2,5% e 2,9%, o que dá aos mesmos analistas o discurso de uma economia forte, de

crescimento sólido.

O que os indicadores liberais não mostram são os 25% de aumento do custo dos

produtos que constituem a cesta básica e os 30% de aumento do custo da energia, afinal a

inflação não é igual para todos; não mostram os quarenta e um milhões de cidadãos e cidadãs

norte americanas que se encontram em estado de pobreza, afinal o P.I.B. não cresce para

todos; não mostram um mercado imobiliário inflacionado pelos bancos e grupos de

investimento que vêm nos imóveis mais uma fonte de especulação e lucro, colocando os

preços inatingíveis para a maioria dos trabalhadores; não mostram uma classe trabalhadora

esmagada nas suas condições laborais que, para fazer face às despesas quotidianas, acumula

dois e três trabalhos para poder levar um salário digno para casa. Afinal o pleno emprego de

Biden é repleto de precariedade e miséria.

No plano externo, por obrigação imperial, impôs-se a estratégia da economia do caos

com a promoção da instabilidade e conflitos como método para atrasar o crescimento chinês. A

guerra económica à China tem criado reflexos inflacionários devido à forte interdependência

que existe entre as duas economias. O maior parceiro comercial dos E.U.A. tem sido a China

que só foi substituída pelo México após o início da guerra na Ucrânia. A exigência

estadunidense de separar economicamente as potências e seus campos de influência

consuma-se através da política belicista e das diversas guerras económicas que a casa branca

promove. O quadro de confronto com a China promete aumentar com a eleição de Trump,

assim como as contradições económicas que essa política externa provoca internamente,

sendo a inflação uma ameaça real para o poder de compra da classe trabalhadora.

3 – Porque não corre a esquerda?

Cansada está a análise sobre a queda do muro de Berlim e a consequente

desorientação política provocada em toda a esquerda mundial. De maior marca ficou o

acomodamento da esquerda aos lugares conquistados eleitoralmente e o seu afastamento da

classe trabalhadora.

O jargão liberal tomou lugar no discurso da esquerda e a radicalidade de proposta foi

substituída pela competência técnica, como se o papel da esquerda fosse agora o de fazer uma

melhor gestão de orçamentos neoliberais que a direita, cabimentando aqui e acolá uma

medida, uma assistência social ou subsídio. A esquerda tornou-se defensora dum capitalismo

humanizado, ente que conseguiu existir em tempos idos da guerra fria e se materializou nas

sociais democracias europeias da segunda metade do século vinte. Na política global de hoje o

“capitalismo de rosto humano” não tem qualquer lugar, sendo seus preconizadores uma

espécie em vias de extinção.

Participando o movimento global que a política fez para a direita, a esquerda perdeu

suas âncoras ideológicas, suas referências políticas e seu trabalho de base que lhe permitia ter

penetração social.

São desenvolvidos diagnósticos de conjuntura cada vez mais distorcidos pelos

indicadores liberais, tomados como fieis tradutores das condições de vida das populações.


Crescimento do P.I.B. é encarado como determinante absoluto da boa política, retirando o

detalhe de quem ganha com esse crescimento; a taxa de desemprego é apresentada como

taxa de satisfação laboral, mesmo que a precariedade extrema esteja camuflada nesses

números; a inflação reveste-se de medidor do poder de compra, não contrastando seu peso em

rendas tão desiguais como as que existem atualmente.

Os objetivos deslocaram-se da disputa política pelo poder para a eleição de

representantes na democracia burguesa. As propostas tornaram-se inevitavelmente pouco

esclarecidas, seguindo os diagnósticos feitos de forma errada. Programas cada vez mais

pastosos surgem na incapacidade de comunicar com a classe trabalhadora, tentando com

medidas liberais acertar nalgum termo decisivo do voto. Propostas neoliberais como educação

financeira nas escolas, P.P.P.(s) e concessão de serviços públicos a empresas privadas

começaram a ser lugar comum em programas e governações de esquerda. A esquerda não só

deixou de apresentar uma proposta de sociedade diferente como foi assimilada e atualmente é

identificada como “O sistema”.

Até na autocrítica perdeu-se a referência, (aqui também me incluo). Termos como

“institucionalização”, “descaracterização”, “perda de identidade” e “afastamento das bases”

ofuscaram o bom velho “aburguesamento” que tão bem define o processo pelo qual passaram

a esmagadora maioria de partidos e quadros da esquerda ocidental.

É sabida a incapacidade transformadora da esquerda per si, não conseguindo seu

voluntarismo ultrapassar o tempo da luta de classes. São as contradições de classe que

determinam esse tempo de luta. Mas Trump e “trumpinhos” só correm na nossa insuficiência de

questionar e propôr a superação do capitalismo que hoje, perante o choque da socioesfera com

a bio e geoesfera, assume forma de extermínio. O neofascismo só cresce na mescla da

esquerda com o capitalismo neoliberal.

Também é sabido que o neofascismo de aparência antissistémica não passa de um

endurecimento político do projeto liberal, dando uma relação musculada entre o estado e a

classe trabalhadora, garantindo maiores margens de lucro para os bilionários, consolidando a

desigualdade social como objetivo a perseguir. Não é assim possível derrotar a política

neofascista sem combater a base económica liberal que a sustenta. A estratégia da frente

ampla para derrotar a extrema direita goza desse pecado original: tenta derrotar a cabeça

política neofascista alimentando seu corpo económico neoliberal.

Trump corre na nossa incapacidade de disputar maiorias sociais que não se revêem no

sistema, que nestas últimas eleições são dois terços da população: um terço que votou em

Trump e um terço de abstenção.

Esta é uma fase da luta de exigência teórica, de valores e de práticas. Clarividência na

proposta social e económica é fundamental para conseguir superar o mundo trumpista que se

edifica. Medo e aburguesamento só garantirão que regimes neofascistas se imponham nos

tempos que aí vêm.


Fontes:

. https://pt.tradingeconomics.com

. https://pt.countryeconomy.com/governo/pib/estados-unidos

. https://www.bbc.com/portuguese/articles/cz0m3l7r5yko

. https://www.census.gov/library/publications/2024/demo/p60-283.html

. https://www.statista.com/chart/26882/us-energy-costs-natural-gas-gasoline-electricity/