Sociedade está madura para Educação que reduza papel dos currículos obrigatórios e estimule prazer do conhecimento — exercitado em bibliotecas transversais e de livre acesso
Estava na sala de professores e professoras, depois das duas primeiras aulas, conversando com meus companheiros e companheiras. O tema era política/eleição, afinal estamos em ano eleitoral, mas quando alguém parou para respirar, entrei na conversa com outro assunto, livros, a deixa para o papo fluir e se tornar menos estressante.
Na conversa sobre livros, resolvi expor uma ideia que trazia desde o início do ano. Criar um projeto de feira de livros, os estudantes poderiam emprestar, trocar, doar ou só expor seus livros, a adesão dos colegas foi imediata, surgiu então a 1a. Feira de Livros e Arte do Cem Setor Leste.
Vamos, dias 9 e 10 de outubro expor nas árvores do pátio interno da escola, cerca de 700 livros e gibis. Vai ser a festa do livro e da arte. Vai ser momento de mais interação dos estudantes, só que agora tendo o livro como intermediário dessa relação.
Não perca. Abaixo uma matéria genial sobre Educação, Livros e Bibliotecas, leia, é para você!
por José Gilbert Arruda Martins (Professor)
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Por uma Pedagogia da Descoberta
Por Derbi Casal, em Bibliotecas Sem Fronteira
O que há nesse “resto”? Toda a experimentação, o conhecimento informal, aprendido nas vivências, os saberes tradicionais, transmitidos pelos mais velhos e a descoberta.
A serendipidade (o princípio da descoberta) só existe quando há liberdade de escolha por caminhos diferentes e aleatórios. A descoberta se dá, principalmente, quando não estamos procurando exatamente aquilo. Esse processo, que não pode ser controlado, é inexistente na grade escolar. Na escola somos todos considerados incompetentes para adquirir nosso próprio conhecimento. E nunca somos estimulados à fazê-lo.
A palavra serendipidade surgiu em referência a um antigo conto persa sobre os três príncipes de Serendip. Em suas aventuras eles viviam se deparando com situações inusitadas e fazendo descobertas ao acaso, encontrando respostas para questões que eles sequer haviam feito. Tinha um pouco de sorte envolvida, mas era a sagacidade dos meninos, um toque genial de mentes abertas para a descoberta, que realmente operava a magia.
Essa qualidade da descoberta não é de forma alguma privilégio de mentes superiores. É uma habilidade e um posicionamento, uma forma de ver o mundo, disponível para qualquer pessoa.
Em geral é proibido (ou vigiado) andar entre as estantes a procura de livros que não se sabe ainda quais são. Isso é feito em nome da “ordem” que sempre vem de cima, e está sempre acima da vivência, pairando sobre ela, limitando suas possibilidades libertadoras.
Há um tipo de acesso à biblioteca, que é transversal, não linear, baseado quase que puramente na serendipidade. Ao conduzir uma leitura, indo de um texto à outro, colecionando trechos diferentes de cada livro sobre determinado assunto, eu estou praticando a descoberta. Aliás foi essa prática que desenvolveu a ciência como hoje a conhecemos e o acesso não linear a uma coleção de livros foi o embrião do hipertexto.
Essa forma de utilizar acervos surgiu lá na antiguidade e se tornou evidente na Biblioteca de Alexandria. Foi responsável pelo desenvolvimento da filologia, da geografia, da matemática, da astronomia, da medicina, da poesia, da filosofia, da história e de muitas outras ciências e saberes.
A serendipidade foi a maior consequência de se acumular livros em uma sala. Isso desenvolveu toda uma economia e ergonomia do saber: o surgimento da paginação, da referência, da citação, da glosa, do colofão, dos sumários, dos resumos, das bibliografias, dos catálogos, das resenhas… Todas essas formas de diálogo entre livros, escritores e leitores.
Uma biblioteca nunca é a mesma para duas pessoas praticando a descoberta. As escolhas, mais ou menos aleatórias, de livros formam caminhos, percursos diagonais, transversais, paralelos, pela coleção toda. O prazer de percorrê-los é como o prazer do desconhecido, é desbravar os universos não domesticados do saber. E é possível reiniciar muitas vezes o processo, sempre com resultados inusitados.
A autonomia de percorrer estantes, pegar livros, ler um trecho, procurar outro livro, compará-lo com um terceiro, pegar uma enciclopédia e, partindo de um verbete qualquer, buscar outras fontes, é o principio do amor pela pesquisa e do autodidatismo. São qualidades fundamentais para o pensamento livre e crítico.
Não provoca nenhum espanto a pouca valorização das bibliotecas e da leitura nos dias de hoje. É um reflexo do que a educação faz com a descoberta. Em tempos em que a homogeneidade de ideias, comportamentos e atividades e a obediência a regras, controles e currículos é o que está nas bases da educação, é bastante esperado que as capacidades revolucionárias e libertadoras das bibliotecas sejam caladas.
A busca por uma forma de educação livre passa pelo resgate da descoberta como veículo da potência humana. A serendipidade em substituição à rigidez curricular. É aí que está a importância esquecida das bibliotecas!
Em uma pedagogia da serendipidade, a descoberta é o centro do aprendizado e a biblioteca é o coração da escola.
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