terça-feira, 31 de março de 2015

CIÊNCIA - História do homem americano emerge em sítios arqueológicos no Piauí

por Sucena Shkrada Resk, para a Revista do Brasil no Rede Brasil Atual
Um verdadeiro museu arqueológico sob o céu da caatinga revela ao mesmo tempo os desafios da conservação ambiental e de um patrimônio cultural da humanidade

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Inscrições feitas há cerca de 100 mil anos, próximas à Pedra Furada, mudaram a teoria da chegada do homem ao continente americano

Cenas de parto, sexo, dança, caça e da contagem dos dias. As ações se misturam, e o cotidiano do ser humano pré-histórico começa a ser desvendado em pinturas rupestres. As imagens em movimento se repetem em diversas formações rochosas em um vaivém constante. Esse é o cenário encontrado no Parque Nacional da Serra da Capivara, que ocupa extensa área, de 129 mil hectares, com vales e chapadões cinematográficos em parte dos municípios piauienses de São Raimundo Nonato, João Costa, Brejo do Piauí e Coronel José Dias.
Neste pedaço de caatinga, a 530 quilômetros de Teresina e a 300 de Petrolina (PE), centenas de sítios arqueológicos descobertos a partir dos anos 1970 figuram entre os mais importantes das Américas. As datações mais antigas da presença humana chegam a 100 mil anos, segundo levantamentos da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), cogestora da unidade de conservação com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A área é declarada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) como Patrimônio Cultural da Humanidade desde 1991. E também é tombada pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O desafio maior, no entanto, é a sua conservação.
A Fumdham – uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) – depende de parcerias e apoios por meio de leis de incentivo para dar conta de atividades públicas e da manutenção. Nos últimos tempos, o apoio está escasso, como afirma a diretora da fundação, a arqueóloga Niède Guidon, 81 anos. “Conseguimos ao longo dos anos construir uma boa infra-estrutura, mas com a atual falta de verbas tivemos de diminuir pessoal e passamos a uma estrutura com 11 guaritas para dar conta de toda a unidade de conservação”, diz Niède, que cobra a manutenção permanente por parte do governo federal, já que o parque é nacional. No mês de agosto, foram demitidos 270 funcionários que tinham o papel de proteger e fazer a limpeza nas áreas onde ficam as pinturas rupestres.
SUCENA SHKRADA RESKInscrições-rupestres-região-do-Desfiladeiro-da-Capivara_foto-SucenaShkradaResk-2.jpgAs imagens rupestres se repetem em diversas formações rochosas ao longo da Serra da Capivara
A fonte de receitas para ampliar a capacidade de manutenção do parque, que cabe ao ICMBio, também é flutuante. O chefe do parque, Fernando Tizianel, explica que, além de recursos fixos federais para pessoal de vigilância e administração, a unidade depende de fontes provenientes principalmente de fundos de compensação ambiental, que são irregulares.
No impasse, está em questão a segurança de patrimônios que permitem uma releitura sobre a chegada do homem ao continente. A teoria antes mais difundida era de que grupos asiáticos teriam chegado da Sibéria, na Rússia, até a costa pacífica da América do Norte, pelo Estreito de Bering, há cerca de 15 mil anos, e alcançado o continente sul-americano 11 mil anos atrás. Segundo Niède, com a descoberta de inscrições rupestres onde fica o monumento geológico da Pedra Furada, que indica o povoamento da região há 100 mil anos, surgiu uma nova teoria de que o homem teria chegado da África à América do Sul, pelo Atlântico. Os dados colocam a ciência em constante movimento e aprofundamentos das pesquisas, que estão em curso na fundação.
Formada em História Natural pela Universidade de São Paulo (USP), a pesquisadora se doutorou em Arqueologia Pré-Histórica pela Sorbonne, na França e deu aula em Paris, trazendo seus alunos para missões no Piauí. Em 1993, se instalou definitivamente na região e foi precursora do parque e da Fumdham. Nesse cenário enigmático, a arqueóloga também encontrou fósseis humanos e de animais pré-históricos no entorno, com o apoio de equipes de pesquisadores brasileiros e estrangeiros. Um rico acervo paleontológico com diferentes espécies, como a preguiça-gigante, que pertence à megafauna, integra os laboratórios de pesquisa. Um elo com o nosso passado remoto.
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Patrimônio arqueológico indica que o homem chegou à América pelo Atlântico, vindo da África

Porta de entrada

Para entender esse mosaico de informações arqueológicas, no meio do semiárido, a pesquisadora estruturou o Museu do Homem Americano, localizado em São Raimundo Nonato, que é fundamental visitar antes da região do parque. A instalação com recursos multimídia traça, por meio de audiovisual, exposições de artefatos e réplicas de fósseis, uma amostra do que é encontrado na unidade de conservação, que tem cerca de 20 trilhas e 50 sítios que podem ser visitados somente em companhia de guias cadastrados pela unidade de conservação. Para chegar nesses locais, só de automóvel, moto ou por meio de ônibus fretados, com autorização prévia. E lá dentro, a maior parte da incursão é por meio de caminhadas de baixa a alta intensidade.
No museu, em um grande telão são projetadas diferentes pinturas rupestres da área. As imagens cadenciadas revelam traços de homens e animais. Começa a ser contada a história da vida e dos hábitos do ser humano no continente. Entre as peças expostas no espaço cultural, uma das que mais chamam a atenção é a réplica de um enterro tríplice em uma pequena gruta, onde estão uma criança e dois adultos. A instalação faz parte do conjunto de 23 sepultamentos pré-históricos encontrados na região. Objetos de cerâmica, adorno e machados milenares também integram o acervo.
A incursão parque adentro exige alguns dias, para quem quiser conhecer os diferentes núcleos. Os mais próximos se encontram a cerca de 27 quilômetros de São Raimundo Nonato, pela BR-020. São os núcleos da Toca do Boqueirão da Pedra Furada, do Sítio do Meio e do Boqueirão de Pedro Rodrigues. Nesses trechos foram encontrados os mais antigos registros da presença humana.
Os imensos paredões, avistados por meio de passarelas, exibem em detalhes as inscrições. Com diferentes tamanhos, as pinturas vão se sucedendo nas rochas. Uma das mais famosas é a “cena do beijo”. Nesse museu a céu aberto não é difícil encontrar alguns animais “contemporâneos”, como o mocó. Esse pequeno roedor se esconde nas fendas e deixa seus “rastros” por onde anda, o que exige mais manutenção, para que as pinturas rupestres não sejam comprometidas.
Uma caminhada um pouco mais exigente ao alto dos chapadões leva a uma vista panorâmica das regiões de planície, geralmente secas na maior parte do ano, mas que em época de chuvas (do final da primavera ao final do verão) revelam o cenário verde da caatinga.
Para se chegar lá é necessário passar pelo distrito do Sítio do Mocó, na cidade de Coronel José Dias, onde vive uma comunidade com cerca de 200 habitantes, que tenta ainda se adaptar ao turismo ecológico. Maura Ferreira Paes Landim mantém com o marido uma lojinha de artesanato rústico, onde vendem peças artesanais. “Na década de 70, aqui era praticamente isolado e as pesquisas e a criação do parque ajudaram entender a importância de se proteger essa área, inclusive como fonte de renda.” O filho Nestor também tem na atividade de guia autônomo do parque uma maneira de ganhar a vida fazendo o que gosta.
SUCENA SHKRADA RESKNièdeGuidon_foto-SucenaShkradaResk.jpgNiède: verba pequena e funcionários de menos
Já no povoado de Barreirinha se destaca o esforço empreendedor de cerca de 30 trabalhadores da Cerâmica Serra da Capivara, que mantém loja no local e atende encomendas de grandes lojas da região e internacionais. Todo o processo de produção das peças pode ser acompanhado e tem como característica especial diferentes desenhos das inscrições rupestres do parque. Cada trabalhador exibe a sua destreza em uma parte da confecção, que tenta seguir princípios ecológicos, evitando desperdícios. Uma dessas etapas é mostrada pelo torneiro Jozias Pereira Paes Lima, 34 anos, ao delinear o formato das peças manualmente.
Neste roteiro, é indispensável também conhecer onde tudo teve início, com a professora Niède Guidon, em 1970. O trecho se chama Toca do Boqueirão do Paraguaio, que fica a 40 quilômetros de São Raimundo Nonato, também pela BR-020, no Desfiladeiro da Capivara. Por lá, ainda há muito chão a percorrer, nas Tocas da Entrada do Pajaú, do Inferno, que é uma grande gruta escondida entre paredões, e a do Baixão da Vaca, entre outras. De certa forma, simula os caminhos percorridos pelos homens primitivos.
Em outro sentido da BR-020, mais um núcleo interessante é o Sítio Vermelho, que fica no lado oposto ao da Pedra Furada. Um relevo diferenciado se apresenta com um detalhe a mais. Ocorre diariamente um espetáculo da natureza, por volta das 17h: neste trecho conhecido por Baixão das Andorinhas, as aves fazem voos sincronizados pelo cânion entre as elevações montanhosas. Parar e concentrar o olhar nessas cenas, que são ritmadas e geralmente acompanhadas pelo pôr do sol, torna a experiência ainda mais envolvente.
O Parque Nacional da Serra da Capivara é essa caixa de surpresas arqueológicas e ambientais, revelando um semiárido rico e ainda pouco conhecido, que recebe anualmente cerca de 20 mil visitantes. Com a abertura em curso do aeroporto de pequeno porte da cidade de São Raimundo Nonato, reivindicado há muitos anos pela pesquisadora, talvez essa projeção possa aumentar. Essa é a expectativa da arqueóloga, que luta, há décadas, pela instalação de melhores vias de acesso e instalações para possibilitar o turismo sustentável na região.
Mais informações sobre a unidade de conservação podem ser encontradas no site: www.fumdham.org.br
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Relatório mostra dez iniciativas para lidar com a questão das drogas

por Agência Brasil no Portal da Rede Brasil Atual
Entre as dez iniciativas, três são de políticas governamentais, duas são de instituições acadêmicas e cinco são de ONGs

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Rio de Janeiro – Um relatório divulgado hoje (31) lista iniciativas para as políticas de drogas no Brasil. O documento foi preparado pelo Instituto Igarapé, organização não governamental voltada para as agendas de segurança e desenvolvimento, proposto para esse segmento nas eleições de 2014.
Segundo a pesquisadora Ana Paula Pellegrino, o relatório mostra que, apesar da política nacional ainda ser prioritariamente voltada ao combate às drogas, há iniciativas que buscam outra resposta para lidar com os usuários de drogas nas áreas de saúde, prevenção e redução de danos. Há experiências que buscam ampliar o debate sobre uma mudança nas políticas sobre drogas no Brasil.
Entre as dez iniciativas citadas no relatório, três são de políticas governamentais (estado de Pernambuco e cidades de São Paulo e São Bernardo do Campo), duas são de instituições acadêmicas (Universidade Federal da Bahia e Fundação Oswaldo Cruz) e cinco são de organizações não governamentais.
“Há uma série de provas de que o combate [às drogas] não funciona. Então se desenvolveram várias práticas que têm uma vontade de escutar essas pessoas que eles estão atendendo [os usuários de drogas], para realmente trabalhar junto dessa pessoa e, se ela tiver um uso problemático de drogas, ajudá-la a se recuperar e a ganhar de volta sua cidadania”, disse Ana Paula.
Uma das iniciativas listadas é o Programa de Braços Abertos, da prefeitura de São Paulo, que oferece moradia, tratamento, assistência social e qualificação de usuários de crack da maior cidade do país.
“Os usuários relatam que se sentirem cidadãos não tem preço. E esse resgate da cidadania, de dar ao indivíduo o poder de comprar um material de limpeza, uma roupa, dá dignidade. Você faz com que ele perceba que há outras possibilidades e que não é só o uso de substâncias que faz sentido”, disse a assessora de políticas de drogas da Secretaria Municipal de Direitos Humanos de São Paulo, Maria Angélica Comis.
A organização não governamental (ONG) paulista É de Lei teve listados no relatório dois projetos. Um deles, chamado Respire busca informar usuários de drogas em festas de músicas eletrônicas sobre as substâncias que estão sendo consumidas e sobre misturas que devem ser evitadas. O outro é um centro de convivência para usuários de crack.
“A redução dos danos não foca na redução do uso necessariamente, mas na melhora da qualidade de vida. Ao melhorar a qualidade de vida dos usuários de crack, a gente consequentemente melhora a qualidade de vida da comunidade onde ele circula, da família a que ele pertence. E podemos torná-lo de novo uma pessoa produtiva na sociedade”, disse o coordenador da ONG, Bruno Gomes.

segunda-feira, 30 de março de 2015

Por que 93% da população brasileira apoia a Redução da Maioridade Penal?

por José Gilbert Arruda Martins


Os grandes e espinhosos temas como, a legalização do aborto, menores infratores, legalização da maconha, criminalização da homofobia, pedofilia, prostituição...para falar apenas de alguns, nunca receberam por parte da sociedade, do Estado, e das instituições, como escola e família, a atenção e a prioridade que merecem.

O noticiário da tevê afirmou que 93% da população, segundo pesquisa feita recentemente, é a favor da redução da maioridade penal (jornal da Band do dia 30/03/2015).

O que explica, um percentual tão alto de apoio à redução da maioridade penal?

Explicar ou questionar tal fato não é fácil para ninguém, até os especialistas, sociólogos, antropólogos têm dificuldade, mas, vamos tentar.

As pessoas entrevistadas, que opinaram na pesquisa,  já debateram, leram sobre o tema ou fizeram um curso na área,  ou conhecem como foi construída e montada a arquitetura que sustenta a sociedade brasileira?

As pessoas que opinaram na entrevista contra ou a favor, não seriam as mesmas que debatem esses temas nas filas no aeroporto, na mesa do boteco, na fila do supermercado ou na parada de ônibus?

Insisto, quando foi que a família, a igreja, a escola, o Estado se reuniu para debater a sociedade brasileira a partir de uma visão democrática que leve em conta a estrutura política e econômica que foi montada ao longo de cinco séculos?

Quando opinamos numa pesquisa sobre tema tão sério, que envolve milhares de jovens do país inteiro, preciso ter um mínimo de conhecimento.

Não podemos esquecer e saber, que o Brasil experimentou quase quatro séculos de regime escravocrata. Onde os escravos, homens, mulheres, jovens e crianças eram apenas mercadoria, "coisa", para enriquecer seus donos.

A construção a cidadania em nosso país, nunca foi uma prioridade das elites governantes. As escolas eram feitas e funcionavam apenas para atender aos filhos dos "bem nascidos". A população negra e seus filhos e filhas eram, na sua esmagadora maioria, analfabetos.

Quando a Lei Áurea foi assinada, pondo fim à escravidão, os ex-escravos com suas famílias, além de analfabetos, não tinham posses e, por isso, foram obrigados a residir nas periferias e morros, sem nenhuma condição digna.

O Brasil até recentemente, não tinha uma única Política Pública de atendimento a essas populações. Os serviços públicos mais básicos, como saúde, educação, transporte e moradia, nunca foram temas prioritários nas pautas dos programas de governo.

As populações mais pobres, sempre tiveram dificuldades enormes para acessar e manter suas crianças e jovens nas precárias escolas públicas.

As pesquisas estão aí para confirmar, a evasão escolar durante o ensino médio, entre as populações de periferias, é muito alta, os jovens, normalmente abandonam a escola para trabalhar e ajudar no sustento da família, que muitas vezes é dirigida pela mãe.

As pessoas que opinaram a favor da redução da maioridade penal sabem que existe no Brasil uma política de extermínio de jovens negros?

Segundo os dados do Mapa da Violência de 2014, foram contabilizados 56 mil assassinatos em 2012, sendo 77% de jovens negros. (http://www.futura.org.br/blog/2014/11/19/organizacoes-da-sociedade-civil-lutam-contra-o-exterminio-dos-jovens-negros/).

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n° 8.069/90, que foi um marco na construção da cidadania no país, já prevê diversos tipos de punições:

"Os adolescentes infratores estão sujeitos às medidas sócio-educativas listadas no Capítulo IV do ECA, entre as quais está a internação forçada (detenção física) por um período de 3 (três) anos, conforme artigo 121, § 3º, do referido Estatuto.

Além da internação, outras possíveis medidas sócio-educativas, listadas no artigo 112 do ECA, prevêem:
  • advertência – consiste na repreensão verbal e assinatura de um termo (art.115);
  • obrigação de reparar o dano – caso o adolescente tenha condições financeiras (art.116);
  • prestação de serviços à comunidade – tarefas gratuitas de interesse geral, junto a entidades, hospitais, escolas etc., pelo tempo máximo de seis meses e até oito horas por semana (art.117);
  • liberdade assistida – acompanhamento do infrator por um orientador, por no mínimo seis meses, para supervisionar a promoção social do adolescente e de sua família; sua matrícula, freqüência e aproveitamento escolares; e sua profissionalização e inserção no mercado de trabalho (arts.118 e 119);
  • regime de semi-liberdade – sem prazo fixo, mas com liberação compulsória aos 21 anos, o regime permite a realização de tarefas externas, sem precisar de autorização judicial; são obrigatórias a escolarização e a profissionalização; pode ser usado também como fase de transição entre a medida de internação (regime fechado) e a liberdade completa (art.120)." (http://pt.wikipedia.org/wiki/Menores_infratores), acessado dia 31/03/15.

Insisto, novamente, não posso opinar, se realmente pretendo colaborar na construção de uma sociedade melhor para todos, se não conheço nada sobre o assunto.

Para dar a minha opinião, preciso conhecer, por exemplo, a realidade da população carcerária do Brasil. Qual seu perfil? por que as pessoas foram encarceradas? quantos são? de que classe social? quais as condições das prisões etc.

Segundo dados recentes do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o número de presos no país chegou a 715,655. Com isso, o Brasil passa a ter a terceira maior população carcerária do mundo. O ranking é liderado pelos Estados Unidos com 2.228,424 presos, seguido da China com 1.701, 344. (http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1465527-brasil-passa-a-russia-e-tem-a-terceira-maior-populacao-carceraria-do-mundo.shtml) acessado dia 31/03/15.

Por que, EUA, China e Brasil têm tantos encarcerados? Até essa lógica, precisa ser pensada e estudada.

Como explicar, que países ricos como os EUA, são também campeões no número de prisioneiros? Será que é apenas a eficácia e celeridade de suas leis? ou será uma economia que prima pela desigualdade e má distribuição da renda? Precisamos entender.

Para finalizar. As pessoas que participaram da pesquisa destacada acima, não podem acreditar que a violência no país tem como principal protagonista o jovem infrator. Se pegarmos as estatísticas atualizadas veremos que, o número de crimes praticados por jovens no Brasil não chega a 0,9% e, se pegarmos apenas os crimes de assassinatos, esse número cai para menos de 0,5%.

Portanto, antes de ouvir e seguir o discurso inflamado de padres, pastores e, principalmente apresentadores de TV, leia e entenda. Conheça a sociedade que você faz parte. 

O Brasil e seus jovens precisam de "Mais escolas, Menos Cadeia"













domingo, 29 de março de 2015

Em vídeo professores de SP explicam os motivos da greve: ‘Você sabia?’

no Portal da Revista Fórum
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por José Gilbert Arruda Martins

A educação pública no Brasil é isso que vocês estão vendo em São Paulo.
Infelizmente, o governador Geraldo Alkmin, de forma autoritária, nem sequer recebe os representantes do professores par negociar, trata da educação com total desrespeito.
E, um fato impressionante acontece, além de muitos outros, a grande mídia não fala nada.
A educação que está em crise, não é apenas a pública.
Pais e mães de estudantes de escola particular, não sabem, ou ignoram, os professores e professoras das escolas particulares de grande parte do país ganham muito mal para cuidar dos filhos da classe média.
São milhares de educadores explorados absurdamente pelos donos de escolas em todo o país.
Existe professor no Distrito Federal que chega a receber menos de R$ 10 por hora/aula.
Essa é a verdade que, não só  a mídia, mas os donos de escolas escondem dos pais e mães. A maioria absurda de professores ganham salários irrisórios para cuidar dos filhos das classes mais favorecidas e ninguém faz nada.


Publicado na Revista Fórum,
Já que 140 mil professores em greve em todo estado de São Paulo parece não ser notícia para os grandes conglomerados da mídia, eles resolveram explicar diretamente à população os motivos de terem entrado em greve.
Fizeram um pequeno vídeo no Youtube intitulado “você sabia?” que começa a circular nas redes sociais. É uma boa estratégia esclarecer à população a situação de calamidade pública em que se encontra as escolas paulistas.
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Retrato do descaso das escolas públicas no Estado. Nas fotos, o apelo dos professores mostrando o lixo, infiltrações, cozinha interditada, goteiras e escoras no prédio escolar Professor Getúlio Nogueira de Sá.  A situação é tão grave que até o G1 resolveu denunciar: G1 – Com goteiras, escola de Jundiaí tem teto escorado com canos de ferro – notícias em Sorocaba e Jundiaí.
Quem irá ser responsabilizado se este teto desabar na cabeça dos alunos?
O que o Ministério Público de São Paulo fez até agora a respeito da situação de calamidade pública de muitas escolas estaduais paulistas?
Parece que os promotores do MP Paulista estão mais interessados em judicializar as ações em prol da mobilidade urbana empreendidas pelo prefeito petista Fernando Haddad (aqui e aquido que garantir que o governador tucano do estado de São Paulo cumpra a lei.
Assim, já que parece que nem mesmo o Ministério Público está interessado em garantir o básico: cobrar do governo do Estado de São Paulo que cumpra o básico: prover as escolas com água, produtos de limpeza e papel higiênico, garantir salas de aula com o limite estabelecido em lei e não com mais de 80 alunos, fazer o governador cumprir o pagamento do piso nacional salarial e dar condições mínimas de higiene nas cozinhas, bebedouros e segurança nas instalações, os professores resolveram usar as redes para ver se aumentam a pressão sobre um governo completamente omisso e irresponsável não apenas com a educação pública, mas com o fornecimento da água para a população do estado e absolutamente tudo relacionado com a coisa pública no estado, dos transportes à saúde.


Aquilo que ninguém conta sobre morar longe dos pais

no Literatortura
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Escrito por Gabriela Schmalfuss, publicado em AgenciaYaih
Com o início da faculdade, um ano e três meses atrás resolvi que era hora de adquirir mais maturidade e dei início a um novo ciclo em minha vida, saindo de casa e indo morar em Porto Alegre. Os avós, que me faziam companhia logo de início, regressaram para São Lourenço. Na teoria, agora vivo com meus tios, mas basicamente sozinha na prática.
É engraçado que com dezessete anos a gente acha que sabe de tudo e ignoramos todos os conselhos achando que não passam de bobagem. Afinal, no mundo perfeito criado em nossa mente, não há espaço para problemas inesperados e muito menos para a temível vontade de voltar, o que acaba caindo por terra já nas primeiras semanas.
Percebi a mudança significativamente quando liguei a televisão e não tinha ninguém com quem disputar o controle remoto. Descobri que domingos são insuportáveis, principalmente depois das seis da tarde, e que tudo aquilo que eu imaginava ter a chance de fazer – mesmo tendo a oportunidade – aos poucos foi perdendo a graça. Que a expectativa de festas 24hrs por dia e bebedeiras intermináveis é apenas ilusão, já que a realidade se resume em virar noites na frente do computador fazendo trabalhos da faculdade ou matando a saudade dos amigos.
Aprendi que faxina com música alta pode ser uma ótima terapia. Que meias sujas, quando viradas do avesso,  se transformam em meias limpas. Que a despensa não se enche sozinha e existem outros setores além do de doces no supermercado.  Que o gás um dia acaba. E, com certeza, que a resistência do chuveiro selecionará o dia mais frio possível para queimar.
Andar de calcinha e sutiã em casa sem se preocupar é ótimo, porém tu te odiará muito quando esquecer de levar a toalha para o banheiro e não tiver para quem gritar (leia-se mãe). Também é importante que se prepare para perder o horário algumas vezes, já que ninguém te acordará caso o teu despertador não toque.
Não te contarão que tu, que sempre odiou feijão, vai se pegar num dia qualquer sentindo falta daquele que só tua mãe sabe fazer. Inclusive, tu sentirás saudades até das brigas com ela. Das implicâncias. Do fato de estar perto, mesmo que sem nenhuma conversa, simplesmente por estar.
Talvez te digam que o silêncio é bom, mas não te lembrarão de que silêncio demais enlouquece. Que pode ser meio solitário não ter com quem dividir uma pizza. Ou que olhar pro lado e se perceber sozinho no meio de uma multidão é uma das piores sensações, já que ninguém ali faz ideia de quem tu és.
Nesse pouco mais de um ano, acho que cresci por uns cinco, no mínimo. Mudei. Acabei descobrindo muitas coisas, e com tudo isso, achando tempo para me descobrir também. Fui para casa várias vezes, viajei bastante, porém tenho consciência de que a maior viagem que fiz foi dentro de mim mesma.
De tudo isso, o que fica é uma grande experiência. Saudade dói, e muito! O novo assusta, mas é nessas horas que a gente aprende mais – nem que seja na marra – e começa a gostar da nossa própria companhia. Cresce.

Livro reúne poemas eróticos escritos por e para freiras nos séculos 17 e 18

no Literatortura
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Publicado no UOL,

Novo lançamento da L&PM, “Que Seja em Segredo” reúne poemas eróticos de autoria de freiras ou inspirados nelas e “escritos na devassidão dos conventos brasileiros e portugueses dos séculos 17 e 18″, como descreve a própria editora. Trata-se de um relançamento da obra, que já saiu pela editora Dantes nos anos 1990 e havia esgotado.
Os escritos são de uma época em que a vocação religiosa não era o principal motivo para jovens serem enviadas aos conventos. Naquele tempo, qualquer mulher considerada “difícil” podia acabar enclausurada. Portanto, esse era muitas vezes o destino das moças excessivamente sexuais, rebeldes, homossexuais, bastardas, das amantes indesejadas e das que perdiam a virgindade antes de se casar ou até mesmo por estupro. Às vezes, até garotas que não eram consideradas problemáticas podiam acabar passando o resto da vida em um convento, graças ao status que as famílias conseguiam por ter uma filha freira.
Mas essa clausura não era tão hermética quanto se imagina. Alguns homens iam encontrar as freiras nas missas ou nos próprios conventos, atraídos justamente pela “proibição” representada por elas e pelas fantasias eróticas que isso despertava. Nascia assim a figura do “freirático”, ou “aquele que frequenta freiras”. Esse sujeito podia ter com as religiosas relações que iam desde platonismo inocente até encontros tórridos que não deviam nada a “Cinquenta Tons de Cinza”, como no relato abaixo.
As religiosas do convento de Santa Ana de Vila de Viana tinham nas proximidades várias casinhas aonde iam, fora de clausura, com pretexto de estarem ocupadas a cozinhar, e recebiam ali homens que entravam e saíam de noite, denunciou em 1.700 o rei, em Lisboa. Nas celas os catres rangiam, os corpos alvos das freiras suavam sob o calor dos nobres, estudantes, desembargadores, provinciais, infantes. Os gemidos eram abafados com beijos 
Ana Miranda, em trecho do texto de introdução de “Que Seja em Segredo”
“Poemas luxuriosos, românticos, por vezes sarcásticos, escritos para e por freiras, em plena Inquisição, documentam tal costume dessa época em que a interdição sexual teve a função de afrodisíaco. Como consequência, celas e conventos eram ambientes de grande licenciosidade”, define a escritora Ana Miranda, vencedora do prêmio Jabuti em 1990 por “Boca do Inferno” e responsável pela pesquisa e o excelente texto de introdução da obra, que não apenas contextualiza o leitor, como também faz uma belíssima reflexão sobre desejo e sensualidade.
Entre os freirático notáveis citados em “Que Seja em Segredo” estão o rei de Portugal dom João 5º e o poeta Gregório de Matos. O primeiro era um entusiasta tão inveterado das religiosas que chegou a mandar construir uma passagem secreta entre sua casa na cidade de Odivelas e o convento local, para que pudesse “frequentar as freiras” com maior discrição e receber leituras de poemas com freiras sentadas em seu colo.
Já Gregório de Matos deixou depoimentos de suas aventuras com as “cortesãs enclausuradas” no Brasil. Incluindo o curioso relato de quando a cama de uma freira com quem estava literalmente pegou fogo. Decerto resultado de uma vela caída, mas o poeta, conhecido como um escritor “maldito”, atribuiu as chamas ao “amor que queimava os corpos através dos espíritos”.
As freiras, no começo, não respondiam às cartas, e apenas os mais persistentes prosseguiam até receber uma resposta, um bilhete recortado com tesoura, salpicado com água de córdova ou outro perfume caro, dizendo que não podia amar, que era muito feia, coisas assim. Mais uma carta de lá, outra de cá, uma cena de ciúmes, de rivalidade, e estava consumada a aproximação. ‘Já que tem de ser, que seja em segredo’, escrevia finalmente a freira ao pretendente 
Ana Miranda, em trecho do texto de introdução de “Que Seja em Segredo”

Veja abaixo alguns poemas eróticos contidos na obra.

Trecho de Antonio Lobo de Carvalho
Puta dum corno, dos diabos freira,
Eu me ausento, por mais não aturar-te;
Tu cá ficas, cá podes esfregar-te
Com quem melhor te apague essa coceira;
Poeta anônimo
Quando eu estive em vossa cela
Deitado na vossa cama
Chupando nas vossas tetas
Então foi que me lembrei
Linhas brancas, linhas pretas
Trecho de poema de Frei Antonio das Chagas
Vem a ser que a freirinha
Se enamorou de doutra freira
Mais que mancebo, cá fora
Quis, lá dentro, ter manceba

Confira alarmante ensaio fotográfico das Mulheres Guerreiras na Síria de al-Assad

no Literatortura
Syria: FSA Women Fighters
“Eu entrei na Síria pela Turquia, no dia 22 de Setembro, com o propósito de chegar a Alepo, cidade onde a luta estava sendo travada. O plano era cobrir as batalhas ao longo das linhas de frente em uma área controlada pelo Exército de Libertação da Síria, na cidade sitiada.
Dois desertores do exército da Síria, agora ativistas rebeldes, eram meus contatos. Eu viveria com e seria guiado por eles pelas próximas duas semanas.
Ao entrar na cidade, o barulho dos bombardeios e ataques aéreos chegaram rapidamente aos meus ouvidos, e a fumaça dos telhados engolfava toda a linha do horizonte. Fiquei surpreso ao constatar que o cotidiano daquelas pessoas continuava normalmente, em meio a fortes explosões de um bombardeio mortal.
Os sírios que decidiram permanecer na cidade escolheram uma vida de medo e pesar enquanto sua família, amigos e vizinhos, são mortos e feridos durante a campanha militar do Presidente Bashar al-Assad, na tentativa de recuperar o controle de Alepo.
“O que você quer que façamos? Que deixemos nossas casas e corramos para a Turquia? Eu prefiro viver em minha casa a viver em condições miseráveis como um refugiado”, diz Ahmed, dono de uma loja nas vizinhanças de Sai Al Dowle, enquanto eu andava em direção a posição de luta do FSA (Free Syria Army).
Eu entrei em Dar Al Chifa, um dos hospitais remanescentes em Alepo. Todo o chão estava coberto por enormes poças de sangue.
Havia um sentimento de desespero e medo. Os gemidos dos feridos e os choros das crianças nos cercavam.
Um dos médicos me disse que o governo sírio deliberadamente mira nos civis. Ele quer assustar a população de Alepo para que não apóiem o Exercito de Libertação da Síria.
Andei pelos escombros da cidade […] Do outro lado, o grupo dos soldados do FSA estavam preparando-se para a batalha.
Um jovem soldado me abordou: “Bem-vindo, bem-vindo, não tenha medo. Agora nós iremos lutar. Nós lutamos por nossas famílias e por nossos amigos. Nós lutamos porque não há nada que nos resta fazer além de lutar.”
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O trecho alarmante e comovente provém de um curto documentário do fotógrafo Sebastiano Piccolomini, que apresenta, também através de fotos, a realidade de um dos países envolvidos na chamada Primavera Árabe: a Síria.
A Síria, influenciada por protestos simultâneos no mundo árabe, passa por uma Guerra Civil que progrediu para uma violenta revolta armada. A luta visa a destituição do Presidente Bashar Al-Assad e a implantação de uma liderança política mais democrática.
A série fotográfica de Sebastiano Piccolomini mostra a força das mulheres sírias, que, em meio a anos incessantes de massacre, decidiram participar ativamente da luta para defender sua família e seus amigos; em um país com uma alta taxa de estupros e com uma tradição que impõe o uso dos véus. Algumas mulheres, ainda de Niqab (véu conservador que deixa à mostra apenas os olhos) mostram seu lado revolucionário e determinado no impactante ensaio que se segue.

“Que escolha nós temos?” – Rana, estudante de 20 anos, membro da única unidade de luta composta apenas por mulheres no Exército de Libertação da Síria.
“Minha casa em Dar’a foi destruída por duas bombas… Mudei-me para Alepo com minha família, e escolhi pegar uma arma e lutar contra o regime. – Om Ahmad, 72 anos de idade, dona de casa e mãe de 3 filhos.
“O Ocidente não vê problema algum na Síria, e, enquanto imploramos por ajuda, nossas crianças, amigos e famílias estão sendo punidos sem motivo algum.” – Ali, estudante de 16 anos.
“Ser abusada por um guarda de segurança do regime na frente do meu marido foi a coisa mais humilhante que já aconteceu com a minha família. Eu peguei uma arma e entrei para a luta.” – Om Faraj, 30 anos, dona-de-casa sem filhos.
“Meu marido morreu na linha de frente. Eu morrerei na linha de frente.” – Fadwa, 20 anos, viúva e mãe de 3 crianças.
“Me sinto otimista. Nós derrotaremos o regime e poremos um fim a pobreza e aos maus tratos.” – Khansa, 42 anos, dona de casa e mãe de 7 crianças.
“Eu luto pela vida e pela liberdade, eu luto para provar que homens e mulheres são iguais.” – Benifet Ikhala, viúva de 27 anos e mãe de 6 crianças.
Revisor: Pedro Dalboni
SOBRE O AUTOR

,16 anos, cursando o Ensino Médio. Sonha em brincar de passarinho e conhecer o mundo. Enquanto isso, conheceu a arte, a literatura, o cinema e as Ciências Humanas, e aprendeu a passarinhar por vários mundos diferentes.

Diferenças culturais e o TDAH: por que as crianças francesas “não têm” Deficit de Atenção?

 no Literatortura

Distracted Student in Classroom
Essa semana foi marcada por muitas discussões quanto a repercussões o lançamento do novo manual diagnóstico psiquiátrico, o DSM-V, durante o 166o Encontro Anual da Associação Psiquiátrica Americana. Mesmo sendo feito por uma organização nacional dos EUA, seu conteúdo influencia fortemente a clínica psiquiátrica em todo o mundo, seja em diagnóstico e tratamento, seja na elaboração de políticas de saúde racionais, seja em estratégias de prevenção e quebra de estigma. E sempre que mudanças são propostas, a polêmica, que já existe num nível basal, se intensifica e explode em vários ambientes, de veículos de comunicação em massa a mesas de buteco: todos tem uma opinião pra dar, geralmente de forma apaixonada. A variação vai desde os mais radicais da anti-psiquiatria que acreditam que não deveria haver nenhum diagnóstico psiquiátrico, que medicações não devem ser tomadas e que a especialidade médica como um todo só trouxe retrocessos para o mundo; até os próprios psiquiatras, que lidam com doentes mentais diariamente e reconhecem suas dificuldades e pensam constantemente em formas de ajudá-los cada vez mais (e  são acusados de criar um “mercado” ilusório).
E daí vêm os argumentos: os “anti” dizem que estão querendo patologizar o normal, e o drama começa dizendo que viver é patológico, que ser humano é patológico… É muito mimimi e pouco informação verdadeira. Os “pró”, as pessoas mais envolvidas com o assunto, tentam explicar o fundamento do diagnóstico psiquiátrico: é necessário que as alterações de comportamento causem sofrimento para a pessoa e/ou disfunção em alguma área da vida, seja no trabalho, seja na família, seja em sua interação com a sociedade. Se isso não existir, uma avaliação psiquiátrica nem se inicia. Assim, se você tem algum comportamento estranho mas está tudo bem pra você, você até gosta, e isso não atrapalha em absolutamente nada de sua vida, eu posso dizer que psiquiatra nenhum vai poder te diagnosticar de nada.
Mas agora um ponto sensível nessa condição são as crianças. Durante o desenvolvimento, as crianças aprendem como perceber o mundo, como lidar com a realidade, como interagir com outras pessoas que existem independentemente dela e que têm seus próprios interesses e opiniões. Aprendem, em suma, como estar no mundo de maneira saudável. A partir daí temos vários momentos, como a fase do “por que?”, em que a criança explora o mundo e tenta significar as coisas de alguma forma; a fase do ciúme com o irmão mais novo, em que não se vê mais como alvo da atenção exclusiva dos pais e têm de lidar com sua agora forçada independência, e por aí vai. Agora como essa percepção ocorre não apenas da realidade externa, mas também da realidade interna, algumas situações podem ser problemáticas. Como uma criança pode se dizer triste, se ela não tem repertório de vivências e sensações o suficiente para caracterizar esse sentimento? Como ela poderia dizer que sente medo, se algumas vezes ela foi criada em um ambiente hostil e essa realidade (externa e interna) é a única que ela conhece? E por conta disso, por as crianças não conseguirem expressar esse sofrimento, geralmente por não entendê-lo ou, em casos mais graves, por não percebê-lo, podemos negar esse sofrimento real? Crianças estão imunes ao adoecimento mental?
E pra isso a única ferramenta que temos é considerar se existe alguma disfunção na vida da criança (que seria secundário a esse sofrimento oculto) é a nossa percepção dessa realidade. Nós, adultos, que já aprendemos a identificar sensações, que já temos uma noção mais elaborada da realidade, a partir de nossas experiências pessoais, vamos usar a nossa visão para avaliar se existe sofrimento naquela criança. É claro que isso talvez não seja o ideal, mas a  noção de urgência é diferente: uma criança com este tipo de sofrimento interno vai perceber e apreender a realidade, construindo seus pensamentos acerca da realidade de uma forma claramente desviada. E as consequências são para todo o restante de sua vida.
Outro aspecto é que a criança não vai sozinha procurar ajuda. Ela é trazida. Alguém, geralmente os pais, percebem que aquela criança é “esquisita, não se comporta como as outras”, e às vezes fica só por aí mesmo. Se essa “esquisitisse” é algo que está no olho dos pais e eles que estão tendo dificuldade em lidar com o filho da forma que ele é, se é apenas o jeito da criança e isso não é um problema para ela, ou se isso é de fato uma patologia com necessidade de intervenção são lados a ser pensados.
E o grande conflito dessa relação pais-crianças-psiquiatra alcança o ápice da discussão no TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade). A prevalência (total de casos num dado momento) estimada global é de cerca de 3,5-4% nas crianças, mas com enormes variações regionais. E isso gerou grande discussão recentemente. Em relação às crianças em idade escolar, a prevalência é de 9% nos EUA e de 0,5% na França. É claro que existem alguns dados relevantes na hora de pensarmos sobre esses dados: a França tem uma classificação própria de diagnóstico em psiquiatria infantil, o CFTMEA, enquanto que os EUA usam o DSM, e sempre alterações nos critérios diagnósticos refletem em alterações no número de diagnósticos. Outra coisa é que países diferentes, com aspectos culturais diferentes, apresentam realidades diferentes para as crianças apreenderem. Mas apesar do mundo externo apresentar tais diferenças, o ser humano é o mesmo, e o processo de desenvolvimento mental irá ocorrer de forma independente da localização geográfica.
O TDAH é, como os outros diagnósticos psiquiátricos, uma construção social. Como a ciência ainda não avançou o suficiente para que possa ser falado em diagnóstico etiológico (avaliando a causa, seja cerebral ou até em nível genético), os diagnósticos são pensados através de como os sintomas se apresentam. Em relação a maioria dessas patologias da infância, como existe a dificuldade de ter acesso ao sintoma referido e só se consegue acessar o sintoma manifesto, a dificuldade de objetivização pode ser diferente. E uma outra questão é a particularidade dos sintomas do TDAH. Diminuição de atenção, percebida principalmente por dificuldades de interação interpessoal e problemas de aprendizado ou outros problemas escolares preocupam os pais. Se juntarmos a isso um comportamento impulsivo da criança e uma quase incapacidade de ficar parada e quieta por um momento, essa preocupação ganha uma proporção maior no ambiente familiar.
Uma coisa importante que deve ser ressaltada é que desatenção e aumento das atividades por uma simples empolgação ou “excesso de energia” são sensações normais para todas as pessoas. A patologia aqui aparece no momento em que esses comportamentos causam alguma repercussão negativa na vida da criança, vista de uma forma que, por sua intensidade, distoa do limite do aceitável naquele contexto. Várias crianças podem apresentar alguma desatenção (mas que a fundo pode ser apenas desinteresse), e alguma inquietação (que pode ser apenas a vontade de realizar alguma outra atividade), e que, mesmo isso não sendo excessivo, algumas famílias podem patologizar esse comportamento em busca da construção de um filho que se adeque melhor as expectativas dos pais. E com a proposta de um tratamento que melhoraria a atenção das crianças com TDAH, de forma a focarem melhor a atenção nas atividades e diminuir essa hiperatividade, fica evidente uma consequência (formalmente secundária) de um aumento da produtividade. É claro que essa criança vai conseguir aprender melhor os conteúdos ensinados na escola, suas notas vão subir, seu desempenho global vai melhorar, e tudo isso é muito positivo. Mas daí aparecem os pais das crianças que não tem um desempenho brilhante e têm traços leves de desatenção e querem que seus filhos sejam medicados. O problema  no estabelecimento de um diagnóstico nesses casos está na percepção dos pais sobre o problema que vem trazida junta com a criança, de forma a superestimar um problema que na realidade não é tão grave.
Essa percepção a partir do núcleo familiar a respeito do que é um aspecto normal da personalidade em desenvolvimento daquela criança e do que é algo de patológico que deve ser tratado varia de acordo com o próprio entendimento de determinado grupo social sobre a infância. E ao compararmos essa percepção entre a franceses e estadunidenses, podemos ver uma diferença grande. E eis aqui o porquê. Na França, o conceito de núcleo familiar é estruturalmente mais forte. É defendido lá que a disciplina e a imposição de limites é saudável e necessário para que ocorra uma apreensão da realidade da forma mais saudável e bem-estruturado possível. Em momentos em que a criança está encontrando seu lugar no mundo, se ver como uma pessoa igual às outras, de forma completa, sem ter uma visão egocêntrica de si são aspectos que são facilitados por esse ambiente criado pelos pais, no curso da educação. Existe uma preocupação maior em ajudar as crianças a lidar com seus problemas de uma forma a ajudar na conquista de certa autonomia. E lá paira uma visão geral de se evitar uso em excesso de medicações, sobretudo psiquiátricas, em crianças. Nos EUA as coisas tendem a ser diferentes. A estrutura familiar não costuma ser pensada de forma a ter  regras e limites, o que em suma significa um estabelecimento adqueado de papéis dos integrantes da família, a fim de se criar um ambiente propício para um desenvolvimento saudável. Outro aspecto é a cultura de resolutividade rápida dos problemas da forma mais cômoda possível. Assim, se uma criança apresenta baixo rendimento escolar, alguns pais pulam etapas na resolução do problema: eles não tentam entender, junto com a criança, se está acontecendo algum problema. Não tentam conversar com os professores para identificar no que eles podem ajudar, e caso seja um comportamento desviado (não digo aqui patológico), não é feita nenhuma tentativa de se alterar a educação que está sendo dada à criança. Eles algumas vezes levam a criança ao médico. E querem medicação.
O diagnóstico psiquiátrico tem, ao olhar da sociedade, um papel polêmico de querer ser controlador e rotulador. No fundo, isso se trata apenas de uma conclusão distorcida de premissas erradas, mas o clima hostil está presente. É claro que os critérios atuais não são uma versão final e imodificável do diagnóstico, e a busca por avanços para melhor identificação, de forma a se reconhecer quais são os doentes que precisam de ajuda e se evitar estabelecer um tratamento para quem não tem tal indicação, é uma grande prioridade dos psiquiatras. Enquanto essa evolução da ciência avança em seu próprio ritmo, as discussão acaloradas continuarão existindo. Barreiras ideológicas serão impostas e pessoas que precisam de ajuda terão dificuldade em ter acesso a um tratamento. Mas para isso talvez a evolução da ciência não seja por si só uma condição suficiente para se mudar essa situação. A evolução deve ser primariamente social. Quando não houver mais esse clima de preconceito e desconfiança, e a reflexão levar a um entendimento mais próximo do real, acredito que nesse ponto as coisas começarão a mudar.

Renato O. Rossi, 23 anos, médico "quase" psiquiatra, envolvido até o talo com a mais diversa gama de variação do sofrimento humano, sempre se apoiando na literatura não apenas como fuga em momentos de tensão, mas também como importante base teórica. Afinal, quem entende mais sobre a vida, o humano e suas ramificações do que aquele que a dedicou a entendê-los em sua forma mais completa e apaixonada que o escritor?