sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Empresas citadas por delator doaram para PSDB, PT, PR e PSD

por José Gilbert Arruda Martins (Professor e Blogueiro)

É a primeira vez que tento reproduzir aqui uma matéria do PIG - Partido da Imprensa Golpista -. A Folha não permite o uso do seu material. Mas a matéria está no jornal on line de hoje. E o título é o acima exposto.


A questão posta é a seguinte.
A "grande" mídia simplesmente "esquece" de divulgar as falcatruas ou quaisquer notícias negativas referentes à oposição e seus partidos políticos. Por que?

Em contra partida, metem o cassete no Partido dos Trabalhadores, nas suas lideranças e no governo diuturnamente. Por que?

As pessoas, trabalhadores e o Povo em geral, é bombardeado a todo momento com notícias negativas sobre o PT e suas lideranças. A rede globo inclusive, criou um novo jornal que começa as 5 horas da manhã e, é aí que inicia a porrada no governo e no PT. O que fica no imaginário popular?

O que fica no imaginário da classe média, que forma suas opiniões e argumentos vendo esse tipo de notícia e lendo a capa da revista veja?

Quando me refiro à classe média, estou falando também de professores e professoras. Profissionais que deveriam ter outras atitudes em relação ao acompanhamento dos acontecimentos em seu país, lendo e vendo outras fontes além da globo, da veja e da rádio cbn - para quem não sabe, a rádio cbn é do grupo globo da família marinho - para forma um juízo melhor da política e não, reduzir suas visões de tal forma que chega a ser chato ouvi-los no dia a dia em nosso local de trabalho.

Essa matéria que o PIG divulgou na internet - não sei se o fez no papel - mostra, primeiro que praticamente 100% dos partidos receberam dinheiro das empreiteiras. Segundo, por que o PIG mete na cabeça das pessoas que apenas o PT é quem recebeu? Terceiro, a Reforma Política é imprescindível.

Para finalizar.

Como o PIG bate no governo e no Partido dos Trabalhadores cotidianamente, nós petistas, nós de esquerda, e o governo precisamos reagir. E a reação, para ser democrática, tem que ser através das instituições, por exemplo, enviando ao Congresso Nacional um Projeto de Lei de Mídias.

Não basta deixar de financiar, suspendendo a veiculação de anúncios da Caixa, Banco do Brasil, BNDES e Correios nas emissoras do PIG. Precisamos ir direto ao debate com a sociedade de uma lei que regule e democratize a imprensa no país como muitos países fizeram.

O governo Dilma precisa ter a coragem de fazer isso.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

“A fábrica da loucura e da depressão não acabou”

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Paulo Amarante, precursor do movimento antimanicomial no Brasil, provoca: só mudança cultural profunda 
pode salvar a reforma psiquiátrica — e o próprio SUS
por José Gilbert Arruda Martins (Professor e Blogueiro)
Deseja conhecer um Médico? Isso mesmo, um Médico com o "M" maiúsculo?
Sempre tive aversão ao autoritarismo, cai exatamente no meio de uma profissão onde a arrogância é cultural; sou professor. Mas os médicos não ficam atrás. Uma professora "doutora" de verdade, pois fez doutorado, da Unb, escreveu uma vez que a empáfia dos médicos começa na graduação e se estende na profissão, e um dos sinais seria a grafia que só eles entendem.
O médico dessa maravilhosa entrevista é um psiquiatra, que, infelizmente, só conheci hoje - 04/12/2014 -, lendo esse texto do Outras Palavras. Digo infelizmente, por que gostaria muito de tê-lo conhecido antes, sua vida profissional, sua militância por uma saúde humana e que respeite o outro é singular.
Se Paulo Amarante fosse estadunidense, já teria virado filme, seria uma espécie de Patch Adams - o médico genial que tentou humanizar o atendimento nos EUA -.
Tenho filhos adolescentes estudando graduação, um deles estuda a área da saúde, digo sempre aos dois - e também ao mais novinho de seis anos -, "construam a carreira de vocês lendo muito, estudando muito, pesquisando muito e pensando muito nas pessoas, que o bom salário vem como natural consequência". Paulo Amarante percebeu isso e hoje parece que curte o que faz, o trabalho parece ser seu hobby, e, talvez por isso também, é uma batalhador incansável em construir um atendimento em saúde mental onde as pessoas são vistas como gente.
Parabéns Paulo, não o conheço, mas sou seu fã.

Leiam a entrevista
Entrevista a Bruno Dominguez*, na Revista Rádis
Desde o início da década de 1970, o presidente da Associação Brasileira de Saúde Mental, Paulo Amarante, acompanha de perto as mudanças no cuidado às pessoas com transtornos mentais. Mais do que isso, participa ativamente dessas mudanças, como um dos pioneiros da luta antimanicomial no Brasil. Avesso a instituições, como ele mesmo afirma, Paulo orientou-se pelo pensamento daqueles que procuraram fazer uma psiquiatria centrada no sujeito, não na doença. “David Cooper observava que a psiquiatria usava o mesmo modelo que estuda pedra, planta e animais para estudar a subjetividade. E na psiquiatria não se tem objeto, se tem sujeito”, observou, nesta entrevista à Radis. Coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps/Esnp/Fiocruz) Paulo critica a redução da reforma psiquiátrica a uma simples reforma de serviços. E defende uma reforma da cultura. “É culturalmente que pessoas demandam manicômio, exclusão, limitação do outro”.
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Amarante: “SUS perdeu espírito da reforma sanitária, como projeto civilizatório. Queríamos transformar a vida, a relação da sociedade com o comportamento do outro, e ficamos restritos a transformar os serviços”.
Como surgiu seu interesse pela psiquiatria?
Começou cedo, durante a faculdade [de Medicina], porque meu irmão já era psiquiatra. Meu pai brincava que a Reforma Psiquiátrica era uma briga minha com meu irmão, já que eu parti para a linha antimanicomial, da qual sou um dos fundadores no Brasil. Sempre tive uma aversão muito grande às instituições. Fui do diretório acadêmico, do movimento estudantil secundarista, fui expulso do colégio… Aliás, tenho uma história longa de expulsões; na escola, por causa do movimento estudantil e porque escrevia um jornalzinho com questionamentos, denúncias de situações do colégio, em um momento de ditadura militar. Sempre foi difícil para mim ser enquadrado.
O que encontrou no Hospital Colônia Adauto Botelho, onde travou seu primeiro contato com a Psiquiatria?
Em 1974, fui trabalhar no hospital, em Cariacica, periferia da Grande Vitória (ES). Foi um impacto grande. Na época havia 800 internos, em uma instituição que talvez não pudesse acolher adequadamente nem a metade disso. Muito mau cheiro, ausência de condições mínimas de habitação, descaso, boa parte dos pacientes nus – isso era comum em hospitais e um dos argumentos era que os pacientes não gostavam de usar roupa, uma verdade, depois de tantos anos esquecidos e sem privacidade; mas não usar roupa era um sintoma, uma consequência. Eu e um colega, João Batista Magro, que também éramos músicos, começamos a reunir os internos para ouvir música, quando ainda não se falava em musicoterapia. Então, fui chamado por um diretor, que disse não ser digno para um médico tocar violão em uma instituição, que tirava a seriedade da profissão. Eu respondi que falta de seriedade era aquilo que acontecia no hospital, pessoas desnutridas, abandonadas, nuas, mal cuidadas.
A atividade com música foi intuitiva ou já estavam influenciados por autores?
Intuitiva. Nunca tinha ouvido falar de Franco Basaglia, da antipsiquatria. Ou, talvez, tivesse ouvido, mas dentro da faculdade certamente não – não se tocava e ainda não se toca praticamente no nome desses autores. Quando apresentei o trabalho de conclusão da minha especialização em 1978, no Rio, fui advertido por estar usando autores contrários à Psiquiatra, como Basaglia, David Cooper, Ronald Laing. O título era Pedagogia da Loucura, reputando que os hospitais ensinavam as pessoas a serem loucas. Eu parti da história de um interno que ficou 40 anos no Instituto de Psiquiatria da UFRJ, com a justificativa de ser supostamente homossexual. Como não havia ninguém para dar lhe alta e, depois, sob o argumento de que não poderia ser cidadão responsável, ficou décadas internado. Também fiz um filme sobre ele, um dos primeiros sobre loucura. O contato com os autores aconteceu quando vim para o Rio, na Uerj, e trabalhando no Hospital do Engenho de Dentro, onde nos reuníamos em grupos de estudos.merdicalizacao 2
Veio para o Rio imaginando que aqui seria diferente?
No último ano da faculdade, em 1976, vim fazer o internato no Rio com essa expectativa. O primeiro contato com o Instituto de Psiquiatria [da UFRJ] não foi ruim. Era uma clínica universitária, com 30 leitos, 15 femininos e 15 masculinos, aquele padrão de enfermaria, com prédio administrativo no meio – sempre houve nessas instituições a preocupação de que os pacientes não fizessem sexo. Eram pacientes de livro, como a gente chama na Medicina, pacientes clássicos: a paciente com sífilis cerebral, o paciente esquizofrênico paranoico com delírio místico. Moravam no hospital porque eram pacientes de aula: quando tinha aula do tema, eles eram levados para a sala, sem qualquer constrangimento.
Se o paciente melhorasse, atrapalhava…
Se tivesse alta, acabava a aula. Alguns citavam os próprios sintomas, já tinham as aulas decoradas. A professora perguntava: “A senhora ouve vozes?” E a paciente respondia: “Ouço, sim, estou ouvindo a voz da senhora”.
A psiquiatra Nise da Silveira trabalhava no hospital nessa época. Havia afinidade entre vocês?
Ela trabalhava em outra linha. Era psiquiatra, mas odiava psiquiatras, como gostava de dizer. E eu respondia: eu também, para provocá-la. A Nise acreditava que o psiquiatra era irrecuperável, e tínhamos que mostrar que estava errada. Os primeiros questionadores da psiquiatria foram psiquiatras: Franco Basaglia, Ronald Laing, David Cooper, Thomas Szasz, Aaron Esterson. No Brasil, também: eu, Pedro Gabriel, Ana Pitta, Jairo Goldberg, todos psiquiatras na fundação do Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental. Era preciso criar uma outra psiquiatria, não uma antipsiquiatria – Basaglia dizia que o termo antipsiquatria podia dar margem a incompreensões. Ele procurava fazer uma psiquiatria centrada no sujeito, não na doença. A psiquiatria errou por focar na doença, fato abstrato, que tomou como fato objetivo, concreto, no modelo das ciências naturais. Cooper observava que a psiquiatria usava o mesmo modelo que estuda pedra, planta e animais para estudar a subjetividade. E na psiquiatria não se tem objeto, se tem sujeito. Nise chegou a buscar pesquisas demonstrando que nossa linha de trabalho estava equivocada. Nós dávamos alta aos pacientes e ela dizia que  eles não tinham preparo para a vida social, que seriam vítima de violência, abuso. A internação representava um certo cuidado, na visão dela. Existem pessoas do campo da reforma psiquiátrica que têm esse pensamento, mas instituição nunca é proteção; favorece mecanismos de violência, controle, perda de autonomia.
O que os levava a defender a internação?
A pesquisa mostrou que, quando aumentávamos as altas, aumentavam também as reinternações, e o dado estava correto. Por isso, tivemos a preocupação de criar uma rede forte de suporte externo, não só de serviço de saúde, mas também familiar. Nise teve papel importante, porque mostrava que outras formas de trabalho eram efetivas. Ela marcou por se recusar a aplicar eletrochoque, por não acreditar que medicação era o grande tratamento. Mas tivemos que tensionar com ela, porque isso tudo poderia ser feito também fora dos hospitais. No final da vida, ela nos apoiou.
Como era a conjuntura nessa época pré-mobilização dos trabalhadores de saúde mental?
De 1976 em diante, começou a haver um movimento de mudança no sindicalismo médico e no conselho de Medicina no Rio. Um exemplo foi a criação do Reme, Renovação Médica, em que médicos questionavam a medicina. Faziam parte nomes importantes, como Carlos Gentile de Mello, que denunciava a mercantilização da saúde, e outros mais jovens, como Sergio Arouca e Reinaldo Guimarães. No mesmo ano, fiquei sabendo que haveria uma reunião para fundar um centro de estudos de saúde, e se criou o Cebes [Centro Brasileiro de Estudos em Saúde]. De uma vez só, conheci [José Gomes] Temporão, Arouca, Reinaldo [Guimarães], Eleutério  Rodriguez Neto, Eric Jenner, Hésio [Cordeiro]. Sempre gostei de escrever, tinha uma máquina portátil, como se fosse o notebook de hoje, e logo me viram como redator do grupo. Tenho comigo o projeto original do SUS – A questão democrática na área da saúde –, que levamos ao simpósio na Câmara dos Deputados, em outubro de 1979. E apresentei no mesmo dia o documento Assistência psiquiátrica no Brasil: setores público e privado, o primeiro da reforma psiquiátrica brasileira. Dentro do Cebes, surgiu a ideia de se criarem núcleos de saúde do trabalhador, saúde da mulher e saúde mental – fiquei responsável por este último. Era um cenário muito favorável, chegamos a ganhar o Conselho de Medicina por um período.
Como se deu sua demissão da Divisão Nacional de Saúde Mental (Dinsam), junto a dois colegas, episódio que se tornou marco do movimento?
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Em 1978, comecei a trabalhar na Dinsam e notei ausência de médicos nos plantões, deficiências nutricionais nos internos, violência (a maior parte das mortes causada por cortes, pauladas, não investigadas e atribuídas a outros pacientes). Investigamos e as conclusões deram muito problema. Outra denúncia era da existência de presos políticos em hospitais psiquiátricos, inclusive David Capistrano, pai, um dos fundadores do Partido Comunista – e existem fortes indícios de que era ele mesmo. Havia médicos psiquiatras envolvidos em tortura e desaparecimento de presos políticos – a Colônia Juliano Moreira [no Rio] tinha um pavilhão onde só entravam militares. Fui chamado na sede da Dinsam e demitido, com mais dois colegas. Oito pessoas, entre elas, Pedro Gabriel Delgado e Pedro Silva, organizaram um abaixo-assinado em solidariedade a nós. Depois, mais 263 pessoas foram demitidas. Isso caracterizou um movimento. Conseguimos manter a crise da Dinsam, como chamávamos, na imprensa por mais de seis meses. 
E essa discussão ganhou corpo…
Em 1978, dois eventos importantes aconteceram, um deles, o Congresso Brasileiro de Psiquiatria, no início de outubro, em Camboriú (SC). Era um evento clássico de Psiquiatria. Nós nos reunimos em um grupo e o invadimos. Já havia uma articulação em rede: em Minas Gerais, o João Magro; na Bahia, Naomar de Almeida Filho e Luiz Humberto, que depois foi deputado federal; Ana Pitta, em São Paulo. Um médico conhecido, já idoso, Luiz Cerqueira, que deu nome ao primeiro Centro de Atenção Psicossocial (Caps) no Brasil, levantou questão de ordem para que o congresso reconhecesse a importância do nosso movimento, e esse ficou conhecido como o congresso da abertura. No Rio, houve o 1º Simpósio de Políticas, Grupos e Instituições, organizado por Gregorio Baremblitt e Chaim Samuel Katz, dois psicanalistas que vinham rompendo com a psicanálise, até então restrita aos médicos. Eles trouxeram para a discussão Franco Basaglia, Thomas Szasz, Erving Goffman,  David Cooper, Ronald Laing e Shere Hite, com grande destaque na imprensa.
A comunicação está sempre presente nas suas respostas — cobertura da mídia comercial, denúncias da mídia alternativa, experiência pessoal com comunicação e saúde, a apropriação por grupos de pacientes…
Sempre gostei de escrever. Criei logo um jornalzinho do movimento, com letras recortadas e coladas uma a uma para formar os textos, porque não tinha equipamento. Como eu estava proibido de entrar em qualquer hospital da Dinsam, ia para a porta distribuir o jornal. Buscamos a apropriação dos meios pelos pacientes, como parte do entendimento de que eles são sujeitos, atores políticos. Daí a ideia de experiências como a TV Pinel [no Rio de Janeiro], a rádio e a TV Tan Tan [em Santos]. Muitos profissionais ainda trabalham a partir da concepção de que fazer jornalzinho é terapia, e não é. É intervenção política, de cidadania, são outras formas de mostrar o mundo, de pensar a diversidade. Hoje existem vários jornais impressos, tevês e rádios comunitárias, com nomes muito criativos, como Antena Virada, TV Parabolinoica e Rádio Delírio Coletivo. São iniciativas importantes, que constroem uma outra noção de identidade desses sujeitos.
Quando se deu sua vinda para a Fiocruz?
Fui convidado várias vezes, mas recusava. O Arouca me chamou em 1982, para trabalhar em planejamento, e eu não conseguia me soltar da saúde mental. Trabalhei com o Arouca quando ele assumiu a secretaria de Saúde do estado do Rio [em 1987], com a tarefa de abrir 33 centros de saúde mental. Quando deixou o cargo, ele e Sonia Fleury me convidaram a criar um núcleo de saúde mental na Fiocruz e aceitei. A Sonia tinha acabado de lançar Reforma sanitária: em busca de uma teoria e, em analogia, eu escrevi Reforma psiquiátrica: em busca de uma teoria. Eu falava que não se deveria reduzir a reforma psiquiátrica a uma reforma de serviços e nem a uma simples humanização do modelo manicomial, ideia que persiste até hoje — “ser mais humano com os coitadinhos”. Defendia que era preciso trabalhar com protagonismo, autonomia; ver esses sujeitos como sujeitos diversos, porém sujeitos. É um desafio dos Caps ainda hoje. Deslocam a tutela para tecnologias menos violentas e invasivas, mas ainda tutelam. Há muita dificuldade em aceitar que as pessoas são diferentes e devem ser diferentes. Minha luta atual é que se pode até suspender a medicação. Isso para médico é um absurdo: eles não acreditam que se possa ser um psicótico sem tomar antipsicótico. É um mito que a indústria farmacêutica criou, que só há um jeito dele se manter vivo, tomando remédio.
O movimento pedia a superação do modelo psiquiátrico. Isso parcialmente se deu na assistência, mas a medicalização continua.menos capsulas
Há uma confusão sobre a superação do modelo assistencial hospitalar asilar manicomial, que está em processo razoável, embora hoje haja novas formas de institucionalização, como as comunidades terapêuticas e as instituições religiosas. O Luiz Cerqueira calculava que o Brasil tinha de 80 mil a 100 mil leitos psiquiátricos no final dos anos 1970. Hoje, são em torno de 30 mil leitos. De fato, reduzimos. Criamos Caps, estamos criando projetos de residências, que já são 2 mil, projetos de economia solidária, projetos culturais. Chamamos de dispositivos de saúde mental. Mas nosso trabalho se concentrou na desospitalização. Quando falamos em desmedicalização, não estamos falando em diminuição do medicamento, e sim na diminuição do papel da medicina. Queremos diminuir a apropriação que a medicina faz da vida cotidiana, o discurso médico sobre a vida. Isso não conseguimos. Um desafio hoje da reforma psiquiátrica é a formulação discursiva muito médica. Por exemplo: as pessoas são contra o manicômio, mas não abrem mão do conceito de depressão tal qual utilizado pela indústria farmacêutica. 
Como lidar com o que se chama de epidemia de depressão?
Temos que pensar até que ponto o próprio aparato psiquiátrico está produzindo essa epidemia — uma discussão central, que não é feita devido ao controle da produção de conhecimento pela Psiquiatria e pela indústria farmacêutica. Boa parte da chamada crise mundial de aumento da depressão é produzida pela Psiquiatria, que não está se preparando para evitar, mas para produzir a depressão. Os relatórios contribuem para que pessoas se identifiquem como depressivas. Os intelectuais orgânicos da indústria farmacêutica têm muito claro que é possível aumentar o número de diagnósticos de depressão ensinando a ser depressivo. “Você chora muito? Tem ideias de morrer?”. Isso produz identificação e as pessoas não dizem que estão tristes e sim que estão depressivas. [Michel] Foucault ensinou que a pesquisa diagnóstica produz diagnóstico. É a produção social da doença. 
No final dos anos 1980 começam a surgir iniciativas alternativas ao manicômio: em 1987 o primeiro Caps e, em 1989, a reforma em Santos (SP). Como se pensavam essas novas formas de cuidado?
As alternativas — ambulatórios, hospitais-dia, centros de convivência — começaram a aparecer no início dos anos 1980, quando deixamos de ser oposição e fomos para o Estado de alguma forma. Em 1987, foi criado o primeiro Caps, em São Paulo, com o nome do Luiz Cerqueira. Mas ainda não havia essa concepção de rede, território e integralidade. O marco inovador foi a experiência de Santos, em 1989. A cidade tinha sua primeira prefeita eleita democraticamente, Telma de Souza, de esquerda — antes havia prefeitos biônicos, indicados pelo Estado. E ela fez uma revolução na prefeitura, nas políticas públicas como um todo. Na saúde, o secretário era David Capistrano Filho, mentor intelectual do Cebes, uma expressão do movimento sanitário. Ele levou à frente uma intervenção na clínica Anchieta, que tinha alta mortalidade. Não quis reformar, mas sim criar uma estrutura substitutiva e territorial — foi a primeira vez que apareceram essas expressões. Hoje se fala muito em rede substitutiva e territorial. A primeira gestão municipal que trabalhou com o projeto aprovado do SUS, ainda que não regulamentado, foi a de Santos. 
Como avalia a participação social nas políticas de saúde mental?
A participação está diminuindo. O SUS perdeu o espírito da reforma sanitária, como projeto civilizatório, e virou mais um sistema de saúde. E o mesmo aconteceu na reforma psiquiátrica: queríamos transformar a vida, a relação da sociedade com o comportamento do outro, e ficamos restritos a transformar os serviços. Houve redefinição do usuário, tido não mais apenas como paciente, mas que não chegou a ser o ator social que queríamos ter — é ator coadjuvante das políticas. Vai nos congressos, nos conselhos, mas não tem força.
E como está a rede de atenção psicossocial hoje?
Desde o início desse processo, levantei a preocupação com os Caps funcionando em horário comercial, descontextualizados do território, como ambulatórios multidisciplinares. Por que fazer uma oficina de teatro dentro do Caps em vez de usar o teatro da cidade? E não basta transformá-los em Caps 24 horas. Vão ser minimanicômios, quando deveriam ser a substituição. É necessário mudar as bases conceituais dos serviços: as noções de doença, terapia, cura, tratamento. Se o ideal for a remissão total dos sintomas, não vai ser alcançado, com ou sem medicamento. Sempre se tem a ideia de uma normalidade abstrata. E o mais cômodo é medicar, apontar que a doença é do indivíduo, está nos neurotransmissores, fazer o controle bioquímico e tutelar pelo resto da vida. 
Que reflexões sua doença recente, um câncer e complicações decorrentes, provocou sobre a institucionalização?
A doença me marcou muito, por minha posição anti-institucionalizante. Minha experiência com hospitais é muito negativa: a relação do aparato médico com o sujeito. Me rebelei muito, questionei, pela perda de autonomia, de identidade. Os profissionais infantilizam e objetificam o paciente. Não sei se a expressão é humanizar, porque humanização me parece mais um conjunto de rituais. Defendo a mudança profunda na qualidade da relação com as pessoas que estão em tratamento. E fiquei pensando nos caminhos que escolhi. Depois da crise da Dinsam, as pessoas foram voltando para o atendimento clínico e eu segui com a discussão do direito à saúde. A ideia de reforma psiquiátrica é limitada, porque o que eu buscava era uma reforma da cultura. É culturalmente que pessoas demandam manicômio, exclusão, limitação do outro. Busquei a transformação da relação da sociedade com a loucura. E mudar cultura é um processo longo, muito demorado.

*Participaram Rogério LannesEliane BardanachviliElisa Batalha e Justa Helena Franco

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

“Tirem o galo do alto da Igreja e coloquem um urubu”. Sim, isso existe, Kamel - Ah, se o Papa souber …

Conversa Afiada reproduz artigo de Fernando Brito, extraído do Tijolaço:

“TIREM O GALO DO ALTO DA IGREJA E COLOQUEM UM URUBU”. SIM, ISSO EXISTE, KAMEL


O papa Francisco bem que poderia ser informado de uma história que está os jornais de hoje, já que ele está manifestamente preocupado com o esvaziamento da Igreja Católica.


O padre  Wilson Luís Ramos foi afastado da Matriz de Santo Antônio, em Adamantina, cidade do interior paulista entre Presidente Prudente e Araçatuba.


O motivo?


Padre Wilson é negro mas não é  isso, segundo Bispo de Marília, diocese à qual a paróquia pertence, não é esta a causa de seu afastamento.


Mas o racismo está lá no cotidiano da elite da cidade .


O próprio Wilson admite que viu duas fiéis conversando sobre a troca do galo que fica no catavento da igreja “por um urubu”.


Ele falou deste racismo logo que assumiu a Matriz:


“As pessoas ainda tem dificuldade de aceitar a raça negra. As pessoas dizem que não, mas eu senti isso da parte de alguns, percebi uma certa rejeição em função da minha cor. Se doeu? Claro que doeu, sou humano, mas isso não pesou na minha missão”.

A principal causa para a transferência é a divisão que Ramos teria causado na paróquia. “O padre Wilson tem sofrido com essa questão. Houve preconceito por parte de fiéis, mas o padre foi vencendo e o que está em jogo agora não é o preconceito, mas sim a divisão que ele causou na paróquia”, afirmou o bispo.


Que divisão?  Um grupo de fiéis tradicionais que enviou cartas ao bispo reclamando do “jeito” simples do padre e, principalmente, do fato de ele atrair pessoas pobres e jovens usuários de drogas para a igreja.


O bispo de Marília mandou, então, dois padres para ouvir os fiéis.


Quase 700 foram ao Instituto Pastoral de Adamantina, cidade que tem pouco mais de 30 mil habitantes.


Segundo o Estadão, a maioria depôs em favor em favor de Wilson.


Que, apesar disso, “rodou”.


Mas, segundo o Ali Kamel, diretor da Globo,  não há racismo no Brasil.


Só em Adamantina, né?


Com todo o respeito, isso não é um problema de religião. É um problema de humanidade.


Filho de Roberto Marinho encontra Dilma - Todo cuidado é pouco.

Conversa Afiada soube que um dos filhos do Roberto Marinho esteve hoje com a Presidenta.

(Eles não têm nome próprio.)

O que o anônimo foi pedir ?

Uma Ley de Médios contra o Google ?

Para manter intocada o Bolsa PiG e o patrocínio a livro pelo Impeachment dela?

Ou manter o Jaques Wagner fora do Palácio e assegurar que o Franklin Martins vá trabalhar na África ?

Para nomear o zé Cardozo Ministro das Comunicações e da Secom ?

Todo cuidado é pouco!

Aos banqueiros ela prometeu ajuste.

O que prometeria ao gestor-oculto da Editoria o Brasil é uma M … ?


Paulo Henrique Amorim

O apartamento de FHC em Paris - Recordar é viver…

Do tuiteiro Política Santos sobre esse Guardião da Moral (dos outros).

O endereço. “Pois é, mas nós sabemos do apartamento que Sergio Motta e você compraram na Avenida Foch”

no Conversa Afiada


(O Janio sabe de cada coisa …)


Paulo Henrique Amorim

                                                      Esse Minha Casa Minha Vida fica na Av Foche ..

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Diferenças entre as relações diplomáticas e consulares

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Relações Diplomáticas

As regras jurídicas que regem as relações diplomáticas estão codificadas na Convenção de Viena Sobre Relações Diplomáticas, adotado em 18 de abril de 1961 pela Conferência das Nações Unidas, contando hoje com cerca de 150 estados participantes.

As funções de uma missão diplomática são: representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado, proteger no Estado acreditado os interesses do Estado acreditante, negociar com o Governo do Estado Acreditado, saber das condições existentes, promover relações amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e científicas.

A classificação do pessoal sobre o artigo primeiro da Convenção de Viena divide-os em: Pessoal diplomático, ou seja, os membros da missão que têm categoria diplomática, pessoal administrativo e técnico, tal como auxiliares administrativos e arquivistas e pessoal do serviço que são os empregados da própria missão.

Quanto às imunidades: Em geral os representantes diplomáticos gozam de imunidade de jurisdição de Tribunais nacionais, e não de uma isenção substantiva. Pode renunciar essa imunidade para então ser aplicado o direito interno. Exemplo: reconvenção

No caso de atos oficiais a imunidade é permanente, uma vez que é do Estado acreditante. A respeito dos atos privados a imunidade é eventual cessando quando o indivíduo deixa seu posto. A definição de atos oficiais não é óbvia, pois se questiona a asserção “no cumprimento” dos deveres oficiais.

Certas imunidades à aplicação do direito interno são secundárias ao corpo principal de privilégios e imunidades. Existe uma isenção de impostos diretos. Contudo os indiretos são cobrados (aqueles cujo valor já está embutido no produto, sem desvencilhá-lo).

Relações consulares

A Convenção de Viena Sobre Relações Consulares é um tratado internacional celebrado em 24 de abril de 1963, que entrou em vigor em 19 de março de 1967.

A revolução da Universidade Federal do ABC

Sérgio Amadeu, ativista pela Internet livre e professor na UFABC
                                                  Sérgio Amadeu, ativista pela Internet livre e professor na UFABC

por José Gilbert Arruda Martins (Professor)

Estava assistindo a um documentário sobre Educação com o professor Pedro Demo da UNB - Universidade de Brasília -, dizia que quando chegou a Alemanha para estudar, entrou no Campus, andou atrás de aula, não encontrou, a Universidade não tinha aulas, tinha e sim centro de pesquisas.

A Universidade Federal do ABC, criada em 2006, portanto pelo governo Lula da Silva, sai à frente? Parece que sim.

Dá para fazer isso, claro, guardando as devidas proporções, no Ensino Médio? Penso que sim.

Iniciação Científica. Sim podemos.

Estudantes escolhendo a sua grade horária? Sim podemos.

Estudantes construindo seu próprio aprendizado, orientados por professores? Sim podemos.

Estudantes participando das principais decisões em conjunto com direção, coordenação, educadores etc.? Sim podemos.

Melhorar as estruturas: Salas de aula, salas de reuniões, auditórios, refeitórios, bibliotecas, áreas de convivências, Laboratórios? Sim podemos.

Como a UFABC fez, o Brasil inteiro pode fazer.

Precisamos é de vontade política, de compromisso de todos que estão envolvidos com Educação Pública no país.


A revolução da Universidade Federal do ABC
no Outras Palavras

Ruptura da estrutura de departamentos, grade curricular aberta e ênfase na pesquisa caracterizam instituição — que avança e é reconhecida, enquanto centros tradicionais mergulham em crise
Por Luis Nassif, no GGN
Com oito anos de existência, a Universidade Federal do ABC (UFABC) é o primeiro caso de sucesso das novas universidades federais.
Com seu reitor alemão Klaus Capelle, a UFABC deverá se transformar em um divisor de águas do ensino e da pesquisa universitária, na passagem para o século 21.
A primeira revolução foi na estrutura interna.
As universidades tradicionais são divididas em departamentos acadêmicos, caixinhas fechadas, compartimentalizadas.
A UFABC inverteu a lógica. Os grandes problemas contemporâneos da ciência e da tecnologia e as demandas das empresas não se encaixam em caixinhas, diz Capelle. A Universidade precisa formar pessoas capazes de resolver problemas, o que passa por uma formação interdisciplinar.
Para tanto, a UFABC foi organizada em três grandes centros:
1.      Centro de Ciências Naturais e Humanas, a etapa da descoberta.
2.      Centro de Engenharia e Ciências Sociais, a etapa da invenção.
3.      Centro de matemática, computação e cognição, a etapa da análise.
***
Durante três anos o aluno receberá sólida formação interdisciplinar, generalista, aprendendo a aprender e sendo empreendedor de sua própria formação, como define Capelle. Por “empreendedor da própria formação”, significa que o aluno tem liberdade para montar sua própria grade.
Os alunos podem sair pelas duas portas de entrada, ou se dedicar a carreiras mais tradicionais: no total de 47 portas de saída, entre graduação e pós. Optando por ela, em dois anos sairá com diploma convencional, já que parte do ensino anterior vale como crédito.
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Na UFABC o aluno é estimulado para a pesquisa desde o primeiro dia.
Mal ingressa na Universidade, o aluno é envolvido em projeto de pesquisa. A maioria não dispõe de informação suficiente para definir seu projeto. Mas irá se beneficiar da experiência em ambiente de pesquisa.
Anualmente, são concedidas centenas de bolsas para iniciantes, com o orçamento da própria universidade.
***
O pós-graduação tem um doutorado inovador, acadêmico-industrial.
Antes de montar o projeto, o aluno recebe uma bolsa CNPQ (Conselho Nacional de Pesquisas) para passar seis meses em empresas conveniadas, buscando desafios científicos e tecnológicos dignos do doutorado.
Se identificar o projeto, ingressa no doutorado e o desenvolve em colaboração com a universidade inteira. O financiamento será integralmente bancado pelo CNPQ, sem desembolso por parte da empresa.
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Em 2006 a UFABC foi inaugurada com 50 professores e 500 alunos, sem campus próprio. Oito anos depois, tem 552 professores, todos com título de doutor, 10 mil alunos, 26 cursos de graduação, 21 de pós, 2 campi próprios, 100 mil m2 de área construída e primeiro colocada em vários rankings.
Em 2012, entre as 2 mil instituições avaliadas pelo MEC, foi uma das 27 que tiraram nota máxima. O estudo holandês  Leiden Ranking of Brazilian Research Institutions and Universities analisou 60 universidades brasileiras e conferiu à UFABC o primeiro lugar em colaboração internacional e o segundo em quantidade de publicações entre os 10% mais citados em cada área.
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Sem a abertura das novas universidades, o país continuaria preso à estratificação das universidades tradicionais.




Escola: desprezado, professor ainda é fator central

Turma da organização Delta Cultura, no Cabo Verde
                                                    Turma da organização Delta Cultura, no Cabo Verde

no Outras Palavras

Nova pesquisa revela: educadores de excelência são capazes de superar problemas de estrutura e motivar alunos
Da redação do PorVir
Quando o assunto é aprendizagem em sala de aula, o número de alunos importa menos do que a qualidade do professor. Isso é o que diz o recente estudo realizado pelo instituto norte-americano Thomas B. Fordham, que estuda excelência educacional. Na tentativa de discutir se estava certo o senso comum de que ter turmas pequenas é sempre a melhor solução, a instituição fez um experimento que tentava medir o aprendizado dos alunos em diferentes configurações de sala de aula. Mesmo com mais alunos, as turmas que saíam melhor era as que tinham os melhores professores.
“Podemos fazer a diferença ao colocarmos apenas mais um ou dois alunos na sala de aula de um excelente professor. É possível que tenhamos muitos avanços a partir de mudanças relativamente pequenas”, disse Michael Hansen, um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, ao jornal The Atlantic. O texto da pesquisa “O tamanho certo da sala de aula: fazendo mais com os melhores” (livre tradução de Right-sizing the Classroom: Making the Most of Great) está disponível para download.
A pesquisa acompanhou alunos de 4a a 8a série de escolas da Carolina do Norte, durante quatro anos letivos. Foram levadas em consideração as notas dos alunos em avaliações oficiais do governo. Além disso, a equipe criou um indicador sobre a atuação dos professores (em um cálculo que considerava o tamanho da turma, sua composição e a experiência do docente), que orientou a realocação de alunos em diferentes turmas. Depois disso, mediram a evolução de desempenho acadêmico dos estudantes.
Os resultados encontrados em cada uma das simulações nas diferentes turmas variou, mas sempre mostrou que um bom professor representava mais na evolução do aprendizado dos alunos do que o tamanho da turma. Uma classe de 8o ano que tinha um excelente professor, por exemplo, chegou a receber mais 12 alunos. O impacto no aprendizado deles causado pela simples mudança de turma equivalia ao alcançado com mais duas semanas e meia de aulas.
“O que estamos dizendo é: ‘OK, alguns alunos vão dar a sorte de pegar os melhores professores e alguns o azar de pegar os professores mais fracos. Mas ao ‘desbalancearmos’ intencionalmente o tamanho dessas salas de aula, estamos fazendo com que mais estudantes tenham sorte”, disse o pesquisador. Na mostra de estudantes e professores com a qual trabalhou, os 25% melhores professores davam aula exatamente para 25% dos alunos, numa proporção matemática com a qual não concorda. “No mundo ideal, as escolas deveriam aumentar o número de alunos pelos quais seus melhores professores se responsabilizam”, diz Hassel.
Uma das principais contribuições da pesquisa, acredita Hassel, é que ela aponta para um manejo de tamanho de turma relativamente simples de ser feito e que não prescinde de políticas públicas complexas ou de muito investimento. Mas, de acordo com o próprio estudo, “a estratégia de mudar o tamanho das salas de aula não reduz desigualdades pré-existentes e algumas outras intervenções serão necessárias”.
A questão do número ideal de alunos por sala de aula, nos EUA e no Canadá, é um tema pulsante. A discussão envolve organizações não governamentais dedicadas especificamente ao tema, institutos de pesquisa e governos. No caso dos dois países, há esforços e investimentos do governo federal para que a proporção de alunos por turma reduza, em ações que custam bilhões de dólares aos cofres públicos. No Brasil, o número excessivo de alunos por turma costuma ser uma reclamação frequente dos professores.


Por um novo professor, capaz de transformar escola

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no Outras Palavras

Estudiosa sustenta: papel de transmissor de saberes esgotou-se. Mas o de orientar alunos em seu próprio aprendizado será cada vez mais indispensável 
Verônica Branco, entrevistada por Ana Luiza Basílio, no Educação Integral
Diferenciação entre ensino e aprendizagem, contestação da tradicional fórmula de transmissão de conhecimento e avanços das tecnologias e da comunicação. Estes elementos demandam uma reorganização da escola e o professor tem um papel central nisto. A opinião é da doutora em educação Verônica Branco, docente do setor de educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Em entrevista ao Centro de Referências em Educação Integral, a educadora analisa as demandas do século XXI e endossa a necessidade da mediação na aprendizagem, que pede um repensar das práticas escolares e, sobretudo, novo posicionamento por parte do professor, que deve sustentar uma postura orientadora, dialógica e capaz de ampliar os conhecimentos para além do território escolar. Confira a entrevista concedida durante o I Seminário Internacional de Educação Integral – TEIA.
Centro de Referências em Educação Integral: De onde se parte para diferenciar o tempo do ensino e o tempo da aprendizagem?
Verônica Branco
Verônica Branco
Verônica Branco: A organização da escola, nos séculos XVIII e XIX, veio acompanhada de uma concepção do ensino atrelada ao transmitir, de passar o que se sabe ao outro. A ideia era de que se aprendia ouvindo, memorizando e repetindo, princípio que ainda se vê hoje em dia. Só no século XXI se tem a clareza de que essa forma é  ultrapassada, desnecessária, até porque o professor não tem acesso a toda essa informação que o jovem tem e a comunicação extra-escolar é, de fato, muito mais eficiente. Também começamos a nos dar conta de que a escola trabalhou muito com o ensino, mas sem uma clareza de seus resultados, validando a lógica de que “se eu ensinei, ele tem que ter aprendido”. Caso contrário, faltou esforço por parte do aluno.
E qual concepção surge após estas constatações?
Verônica Branco: Surge a preocupação com a aprendizagem, desvinculando-a do ensino. Porque o ensino é trabalho do professor e a aprendizagem, do aluno. Isso não quer dizer que quem ensina não aprenda, mas temos segmentos responsáveis por essas habilidades. O professor, então, passa a ter o papel de repensar o ensino e suas práticas, já que transmitir não é mais o esperado. A conduta é de mediação, ou seja, orientar a aprendizagem a partir dos recursos já existentes, apoiando os alunos na leitura, interpretação e apropriação das informações, gerando conhecimento.
TEXTO-MEIO
O aluno que não aprende passa a ser problema do professor, uma vez que se passa a avaliar em que medida ele atendeu as necessidades do estudante. Por isso, há a necessidade do docente garantir esse espaço de experimentação e reflexão para os sujeitos, que se torna possível ao conhecê-los e considerar os diversos contextos que os rodeiam.
Como esperar que a escola dê conta dessa integralidade do indivíduo, se não resolveu muitos dos problemas relacionados ao ensino?
Verônica Branco: Não estamos mais nessa evolução linear que a humanidade foi alcançando em séculos. O conhecimento deu saltos exponenciais. Isso mostra o quão ineficiente se torna  um professor se fechar em sala de aula com cartilha e quadro negro e tentar resolver a alfabetização, por exemplo. As crianças precisam aprender o que fazer com a leitura e escrita no mundo. Elas devem sair, ler as placas e cartazes, e estabelecer significado para o que aprendem. É aí que o professor pode atuar como mediador.
Verônica Branco: Eles estão preparados para esta nova função?
A questão é que eles também não são formados para isso. As universidades ainda trabalham como se os docentes fossem reproduzir a sua lógica de ensino; muitos professores universitários nunca pisaram em uma sala de aula. As discussões nas formações abordam teoria ou filosofia, mas não as práticas de ensino.
As crianças aprendem mais quando estão imersas em uma situação. Os professores têm que fazer uso disso e ajudá-las a sistematizar esses conhecimentos, de maneira integrada. É nessa medida que o tempo do ensino e da aprendizagem ainda são diferentes, porque são postos em caixinhas desconectadas. A escola se ocupou da educação formal e não dialoga com a que vai acontecendo ao longo da vida.
Verônica Branco: E como a escola deve se articular para que esse processo aconteça?
Verônica: Há um ponto central nas discussões sobre educação integral que é: precisamos de mais tempo. As quatro horas, organizadas em 50 minutos, já eram insuficientes para o modelo em que o professor tinha que transmitir conhecimento. Hoje, a mediação pressupõe participação e não se encaixa ao modelo. E veja que estou apenas falando do tempo em sala de aula.
Esse conhecimento também está no mundo, ou seja, as crianças têm que sair da escola. Claro que algumas coisas podem adentrar esse ambiente, mas é preciso considerar o tempo de levar as crianças para a rua, ao parque, ao cinema ou ao teatro. A escola tem que se assumir enquanto espaço de organização e não somente um espaço de permanência.
Vista a defasagem na formação dos professores, como imaginar que eles possam dar conta desse arranjo?
Verônica Branco: Eu não fui formada para ter filhos. Como eu aprendi? Na vida. Fui buscar os livros, outras referências e fui aprendendo com tudo isso. É um processo de se abrir também, de buscar o conhecimento que não se tem. O professor também precisa estar aberto a aprender, não só as crianças. Aí é que está o problema, fechado ele se sente protegido, fecha a porta e faz o que quer dentro da sala de aula. Ele ainda não se deu conta de que é um ator social e que tem compromisso com cada uma das crianças. O professor é o principal articulador do arranjo de educação integral.
Como vê essa implementação?
Verônica Branco: Nas discussões de educação integral, sempre aparece a questão do espaço mas este  não é o maior problema. O professor tem que ser o maior foco para garantir essa revolução que pretendemos nas escolas, para que elas deixem de ser jurássicas. É um trabalho que independe do espaço, começa a partir da formação do professor, para que ele seja capaz de expandir esses espaços, esse território da escola para o seu entorno.
Temos aí o Plano Nacional de Educação que quer 50% das escolas ofertando educação em tempo integral nessa década para pelo menos 25% dos alunos (meta 6). Isso não é pouco em termos de Brasil, temos muito a fazer ainda nessa década.