segunda-feira, 27 de julho de 2015

'Não vai haver golpe nem impeachment'

na Carta Maior

Realmente estou tranquilo', diz o jurista Dalmo Dallari, um dos artífices da Constituição.

Isaías Dalle - Portal CUT
Roberto Parizotti

“Aqui eu moro na roça”, diz Dalmo Dallari, ao nos receber em sua casa com jeito de morada no campo, encravada num bairro totalmente urbano na capital de São Paulo. Árvores frutíferas, pássaros, gatos e um lago artificial compõem o cenário bucólico, vez ou outra contrastado com o barulho dos jatos que passam a baixa altitude.
 
Não bastasse seu ar sereno, ele faz questão de afirmar: “Eu estou absolutamente tranquilo quanto à manutenção da ordem brasileira”. O jurista e professor, que entre 1986 e 1988 percorreu o Brasil articulando a participação popular na feitura da Constituição, continua com os pés e os olhos nas ruas e diz que Dilma seguirá em seu mandato até o final.
 
Sua segurança é tanta que sugere retirar a palavra impeachment da pauta.
 
Saiba o porquê lendo os principais trechos da entrevista:
 
Professor, como o senhor tem visto a conjuntura política: sequências como o comportamento do presidente da Câmara e essa mensagem constante na imprensa sobre a tese do impeachment, da derrubada iminente da presidenta? Qual sua avaliação? O sr. vê possibilidade de ruptura, de quebra do Estado de Direito?
 
Nesse ponto eu estou tranquilo. Não vejo possibilidade de ruptura, de quebra da ordem constitucional, entre outras coisas porque os que hoje atuam mais fortemente na política brasileira não têm o mínimo respeito pela Constituição. Então, para eles, ter ou não a Constituição, mudar as regras, isso não tem a mínima importância. Eles fazem pequenos ajustes, só para dar uma aparência de constitucionalidade, de legalidade, mas, esse é o ponto essencial, os que hoje fazem o jogo político, que dele tiram vantagem, não têm necessidade de suspensão da Constituição.
 
Esse é um paradoxo, uma contradição, mas ao mesmo tempo, um ponto tranquilizador. Como eles não respeitam a Constituição, eles não têm interesse em revogar a Constituição. Revogá-la daria muito trabalho, é muito arriscado, poderia gerar reações violentas, então não interessa.
 
A minha conclusão é que não existe risco porque não há interesse. Não há uma só força, uma corrente, interessada na suspensão da ordem constitucional formal. Eles na verdade desrespeitam, e o Eduardo Cunha é um exemplo evidente disso, como dias atrás, repetindo votações, isso é absolutamente inconstitucional.
 
É como tenho escrito no único espaço que me restou na imprensa, que é a versão eletrônica do JB, nós não temos parlamentares, temos “paralamentares”. E tanto a Câmara quanto o Senado têm dado demonstrações disso: são absolutamente lamentáveis. Não há nenhuma grande liderança, não há nenhum partido coeso, com posições definidas, e com fidelidade à programação partidária. Isso realmente desapareceu.
 
Mas esse é o grande paradoxo: isso tira o risco de um golpe. Porque ninguém tem interesse no golpe.
 
O sr. falava de desrespeito sistemático à Constituição. Para o sr. que foi um especialista e um militante que atuou intensamente na elaboração da atual Constituição, como se sente ao ver esse desrespeito ?
 
Na verdade é profundamente lamentável. De qualquer maneira eu fico feliz de que a Constituição continue em vigor, com conteúdo absolutamente humanista, democrático, e isso é uma conquista do povo brasileiro. Então é muito importante que ela seja preservada. Eu quero lembrar que participei efetivamente da Constituição, discursei em plenário, mas como um constituinte cidadão. Sem mandato. Porque eu fui convidado para participar formalmente, mas para isso eu teria de ter filiação partidária, e eu não queria. Não fui e não sou filiado a partido algum existente no Brasil. Isso para mim é fundamental, pois eu sou um jurista e um professor, então é muito importante a minha independência e autonomia, e quero que meus alunos acreditem nisso. Eu estou falando por convicção, meus valores têm como base a dignidade da pessoa humana. Em termos didáticos, em termos de ação política, os grandes valores são a Justiça e o Direito. É isso que me direciona. Quando faço análise, avaliação do comportamento do político, eu parto desses pressupostos: o quanto eles estão coerentes com a Justiça e o Direito.
 
Agora o sr. vê uma situação melhor ou pior que em outros momentos do período pós-redemocratização?
 
Nós já tivemos momentos muito ruins, muito negativos, por causa justamente desses desvios partidários, desses desvios políticos. Pode ser que hoje isso tenha adquirido uma visibilidade maior. Acho que há inclusive uma grande responsabilidade da imprensa. A imprensa valoriza demais os pormenores de corrupção e de desvio. Há uma evidente obsessão anti-Lula, anti-PT, que contribui bastante para esse desvirtuamento.  Quando a imprensa percebe ou suspeita que alguma acusação pode atingir o Lula, isso vira manchete. Isso está inclusive na base da supervalorização, excessiva valorização, da delação premiada. A delação premiada acabou tornando delinquentes, criminosos confessos, em grandes personagens. Porque eles fazem delações que poderão atingir o Lula, o PT, as esquerdas.
 
A delação, em tese, o sr. vê como um instrumento legítimo, mas supervalorizado neste momento, ou não, a deleção não é um bom instrumento?
 
A delação, da maneira como foi constituída, é mais negativa que positiva. Ela, de certo modo, é a aplicação de uma criação italiana. Quando a Itália estava num momento difícil, combatendo a Máfia, foi criada a figura do arrependido. Era o mafioso que, sendo preso, aceitava fazer denúncias para ser beneficiado no processo, às vezes até perdoado.  Isso fez surgir a figura do delator premiado, que na verdade não é um arrependido, é alguém que está negociando para sair melhor de uma acusação ou de um processo. Mas é altamente duvidosa a espontaneidade desse indivíduo, pois o delator ou está sofrendo ameaça ou está sofrendo uma oferta muito conveniente para ele. Então, isso também é uma forma de coação. Não há coação física, mas há coação psicológica. Por essa razão, tenho sérias restrições à delação premiada.
 
Lembro que há outros países que passaram por momentos de maior investigação. O que acontece que nós estamos colocando isso na linha de frente, há uma teatralização, estamos explorando o espetáculo. Existe, sim, uma consequência econômica, pois muitos investimentos eram feitos graças ao recebimento de dinheiro público, ou de instituições como a Petrobrás. Esses investimentos deixaram de ser feitos, mas as empresas continuam existindo. Eu tenho amizade e conhecimento com muitos empresários, e não conheço nenhum caso em que um deles tenha ficado pobre. Na verdade há uma choradeira porque houve redução de ganho. Mas isso está longe de significar que essa classe socialmente privilegiada está em dificuldades. Por isso não acredito no risco de graves e gravíssimas consequências econômicas. Há sim, um período de diminuição dos investimentos, inclusive porque eles têm recebido menos dinheiro público. Mas eles têm interesse na manutenção dos negócios. Então, haverá uma diminuição do ritmo, mas depois de um tempo deve se ajustar e passar, não tenho dúvida nenhuma.
 
Delação premiada nos remete de pronto à Operação Lava Jato. Economistas e mesmo dirigentes sindicais relatam que há setores de atividade que estão desacelerando, em virtude das investigações.  O sr. acredita que um processo como esse de investigação possa conviver com o funcionamento normal da economia? Já houve algum processo semelhante, em outro país, que não tenha paralisado a economia?
 
Lembro que há outros países que passaram por momentos de maior investigação. O que acontece que nós estamos colocando isso na linha de frente, há uma teatralização, estamos explorando o espetáculo. Existe, sim, uma consequência econômica, pois muitos investimentos eram feitos graças ao recebimento de dinheiro público, ou de instituições como a Petrobrás. Esses investimentos deixaram de ser feitos, mas as empresas continuam existindo. Eu tenho amizade e conhecimento com muitos empresários, e não conheço nenhum caso em que um deles tenha ficado pobre. Na verdade há uma choradeira porque houve redução de ganho. Mas isso está longe de significar que essa classe socialmente privilegiada está em dificuldades. Por isso não acredito no risco de graves e gravíssimas consequências econômicas. Há sim, um período de diminuição dos investimentos, inclusive porque eles têm recebido menos dinheiro público. Mas eles têm interesse na manutenção dos negócios. Então, haverá uma diminuição do ritmo, mas depois de um tempo deve se ajustar e passar, não tenho dúvida nenhuma.
 
 
No início de nossa conversa, o senhor dizia que não vê risco de uma ruptura institucional. Eu gostaria de perguntar sobre aquela modalidade de golpe conhecida como golpe paraguaio, em referência à derrubada do presidente Fernando Lugo. Derruba-se um mandatário, sem necessariamente ter provas.  O sr. acredita nessa possibilidade aqui no Brasil?
 
Eu não vejo essa possibilidade pois nenhum partido, seja de direita ou de esquerda, situacionista ou oposicionista, nenhum deles tem unidade. Todos estão bastante divididos. Os partidos estão muito fracos. Então não existe a possibilidade de formação de uma força política coesa, uniforme, que tomasse uma posição desse tipo, a de destituir a presidente. Eu não vejo nenhuma possibilidade de isso ocorrer no Brasil. Realmente, estou tranquilo.
 
Muitos estão preocupados com a manifestação anti-Dilma convocada para o próximo dia 16 de agosto. O sr. acredita que esse tipo de manifestação possa crescer e frutificar?
 
Eu acredito que não. O que aconteceu em 2013 acabou nos revelando o verdadeiro alcance dessas mobilizações. Elas são momentâneas, e todas, sem exceção, recebem infiltrações, não têm uma unidade, e por isso elas não têm grande força. Sempre existem o falso protestador e o falso manifestante. Aqueles que apenas querem tirar algum proveito ou aquele que só quer participar do espetáculo. Em 2013, ficou no subterrâneo, ninguém revelou quem financiava os grandes grupos manifestantes. Grupos que se mobilizavam, viajavam de outras cidades para São Paulo, e não vinham a pé, e todos bem vestidos e bem alimentados. É porque eram pagos, em grande parte. Então, elas não têm autenticidade, elas são só uma aparência, um espetáculo. E o que se está anunciando agora é só a repetição do espetáculo. Não passará disso. Por isso, eu estou absolutamente tranquilo quanto à manutenção da ordem brasileira.
 
Alguma ideia sobre quem seriam os financiadores?
 
Evidentemente só pode financiar quem tem dinheiro. São empresários, setores econômicos envolvidos nisso. São setores que têm interesse nesse clima de temor para obter maior proveito. Então, redução da tributação. Isso já tem sido referido muito ostensivamente, descaradamente: eles serão a favor do governo se os impostos diminuírem. Então, qual a verdadeira intenção, o verdadeiro interesse? O interesse não é do povo, é dos empresários.
 
Voltando um pouco. O sr. falava, no início, que vivemos um momento de sistemático desrespeito à Constituição. Como saímos desse estado de esgarçamento e voltamos – se é que já estivemos um dia – a um momento de respeito,  implementação e desenvolvimento da Constituição?
 
Não há dúvida alguma que a Constituição de 88 foi responsável pela correção de muitas injustiças sociais no Brasil. No caso do Nordeste, por exemplo, a prática do coronelismo perdeu muita força. Ainda existem casos, como o do Collor e do Renan Calheiros, mas com muito menos força que antes. Eu viajo o Brasil inteiro e sei que houve muitas melhorias, e isso em grande parte graças à Constituição de 88. Há um longo caminho ainda a ser percorrido. O que é necessário é reacender, é redespertar a consciência do povo.  Eu falo isso porque fui uma espécie de caixeiro viajante da Constituinte, percorri o País apresentando propostas, debatendo, e recebendo contribuições. Grupos pequenos, de lugares distantes dos grandes centros, elaboravam ideias e encaminhavam para a Constituinte. Houve sim uma grande participação popular. O que temos é que reacordar a consciência do povo.
 
E como podemos fazer isso?
 
É falando, escrevendo, pregando. Insistindo nesse ponto: deixar as intrigas, as diferenças, parar de falar que estamos correndo risco de golpe – isso só alimenta o temor, a espetacularização. O que temos é, por meio de todos os instrumentos possíveis, na imprensa, na escola, nas reuniões, onde for possível, dar o grito de alerta: “Acorda povo”. É dizer que esses corruptos, esses que estão nas manchetes fazendo papel de moralistas, e que todos sabem que são corruptos, todos eles foram eleitos pelo povo. E o povo elege e reelege. Há casos mais do que conhecidos. Apenas para ficar num exemplo, eu citaria Paulo Maluf em São Paulo. Paulo Maluf é notoriamente corrupto, confessadamente corrupto, e é um homem que levanta um milhão de votos com facilidade. Então, onde estão esses eleitores? Por isso eu tenho usado a expressão eleitor ficha limpa. Então, o grande tema que deveria estar sendo debatido pela imprensa, pelos movimentos sociais, é a conscientização do povo.
 
No seio dos movimentos sociais, existe uma preocupação que se houver desmobilização, pode vir o golpe. Mas o sr. diz que falar em golpe é alimentar o temor. O sr. sugere que se tire esse tema da pauta?
 
Exatamente. Retirar o tema da pauta. Assim, por exemplo, nunca mencionar a palavra impeachment. Porque isso é uma farsa. Não existe nenhuma possibilidade legal, jurídica e constitucional de impeachment da Dilma. De vez em quando volta, alguém fala nisso, o Aécio Neves fala, e o tema volta. E isso é uma farsa. Não há a mínima possibilidade. Então, não se mencione mais isso. Porque isso serve para alimentar o temor dos mal informados. Então, eu penso isso, a pauta tem de ser repensada. Não se deve dar espaço para essa onda de temor. Hoje mesmo pensei nisso, ao ver uma manchete de jornal mencionando o Lula. O jornalista, o editorialista desse veículo deve ser muito ignorante. Porque esqueceu um velho brocado que diz “fale bem mas fale de mim”. Então, sempre que falarem do Lula, ele estará na linha de frente. Do ponto de vista estratégico deles, é uma burrice monumental.
 
Ao final do ano passado, acreditava-se na possibilidade de uma reforma do sistema político por intermédio de uma assembleia constituinte. O sr. ainda acha isso possível, apesar dos recentes acontecimentos?
 
Primeiro, eu acho que precisamos sim de uma reforma do sistema político. Precisamos repensar o financiamento dos partidos, rediscutir o sistema representativo. Mas não há nenhuma necessidade, assim como não há possibilidade, de convocar uma constituinte para isso. Tudo deve ser feito a partir da Constituição, pois ela mesma dá os caminhos, apontando possibilidade de mudança na legislação. A Constituição prevê a elaboração de emendas pela população, o povo como legislador. Isso já existe, mas só acontece com mobilização popular. Isso é até um caminho para a ação política.

Presidenta sai para pedalar e escuta gritos de Dilma eu te amo

no Blog Amigos do Presidente Lula

Quando a notícia é boa, favorável ao governo, a imprensa publica uma notinha, em letras miúdas, no rodapé da página do jornal. Afinal de contas, notícia boa não vende jornal. Foi isso que fez hoje o jornal o Estado de São Paulo.


Com a manchete tímida, em três linhas,: “Presidente sai para pedalar e escuta gritos de 'Dilma eu te amo”   A presidente Dilma Rousseff saiu para pedalar neste sábado, 25, nas imediações do Palácio da Alvorada. Dilma percorreu aproximadamente seis quilômetros, das 7 às 7h30, acompanhada de seguranças e do personal trainer. Ao chegar de volta ao Alvorada, ouviu dois homens gritarem "Dilma, eu te amo!". Um deles era servidor do Ministério da Integração Nacional.

domingo, 26 de julho de 2015

Luiz Fernando: 'Vemos grandes ladrões chamando o PT de corrupto'


na Rede Brasil Atual"Temos de conversar com a base e achar uma forma de reagir, porque o que está em jogo é o nosso projeto de Brasil", diz deputado estadual de SP, representante do ABC paulistapor Karen Marchetti, do ABCD Maior
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Luiz Fernando diz que para oposição ter acesso a informações do governo Alckmin é preciso estar nas frentes parlamentares
São Paulo – O deputado estadual Luiz Fernando (PT), representante do ABC paulista, estreou na Assembleia Legislativa em uma legislatura marcada pelo aumento da bancada de apoio ao governador Geraldo Alckmin (PSDB). De 24 deputados anteriormente, o PT agora tem apenas 14. Quatro meses após a posse, ele diz que a única forma de a oposição ter acesso a informações importantes na casa é pela participação em frentes parlamentares, com objetivo de exercer o papel de fiscalização, "que é a prerrogativa que um deputado tem como membro".
Nesta entrevista à repórter Karen Marchetti, do ABCD Maior, o deputado analisa que o governo e o PT passam por uma crise porque o capital e a elite nunca aceitaram a chegada da classe trabalhadora ao poder, com a eleição do ex-presidente Lula, e critica a onda conservadora no país: "Se a direita puder escravizar os negros e índios, vai fazer".
Lembra que no julgamento do mensalão (Ação Penal 470), prenderam petistas sem nenhuma prova e que não houve reação do partido e do governo. "Erramos aí, e a nossa comunicação é ruim. Somos bom de governar e ruim de nos comunicar."
Sobre uma possível candidatura para a eleição municipal de São Bernardo em 2016 não descartou estar no páreo, mas garantiu que não haverá prévia na cidade. Apoiará o atual secretário de Serviços Urbanos, Tarcisio Secoli: "Se o Tarcisio for escolhido candidato, vou coordenar a campanha dele, se eu for escolhido, o Tarcisio deverá coordenador a minha campanha. Somos amigos e o quero muito bem".
O sr. está no primeiro mandato como deputado estadual. Já é possível realizar alguma avaliação desses primeiros meses na Assembleia Legislativa?
Assumi numa bancada diminuta, pois o PT tinha 24 deputados, o que foi reduzido para 14 parlamentares após as eleições de 2014, diante de uma bancada amplamente governista. Isso nos fez trabalhar com a lógica da qualidade e, por isso, tenho a preocupação de qualificar o meu mandato. Tenho a bandeira da defesa da criança e do adolescente, além da segurança pública, investindo mais em esporte, cultura e educação, o que, com certeza, reduzirá os índices de violência. Durante a campanha, destaquei que se fazia importante termos deputados da região (ABC paulista), pois sempre conquistamos representantes de cidade, mas nunca tivemos parlamentares que pensem regionalmente, como o Consórcio Intermunicipal do Grande ABC. Óbvio que sou de São Bernardo, tenho como líder o prefeito Luiz Marinho (PT), porém, tenho combinado essa ação regional.
E o trabalho nas frentes parlamentares?
Estou em três frentes parlamentares, entre elas, a Frente do Transporte da Região Metropolitana. O grande interesse nessa questão é debater a Linha 18 do Metrô, que atenderá à capital e também São Bernardo, além dos trens, que passam por Santo André e Mauá. Atuar dentro das comissões é a única forma que a oposição tem para ter acesso às informações importantes, com objetivo de exercer o nosso papel de fiscalização, que é a prerrogativa que um deputado tem como membro. Também estou na Frente Parlamentar para discutir a situação do Jardim Pantanal, uma região da zona leste de São Paulo que ano após ano, a gente vê pessoas perdendo a vida, porque é uma área abandonada da capital e tive votos importantes lá, o que me faz debater de forma ímpar na Assembleia Legislativa as ações dos governos federal, estadual e municipal. E, por último, estou na frente parlamentar, que estamos em vias de lançar, para discutir a situação do futebol no estado. Estou em outras frentes parlamentares, sou membro das comissões de Transportes, Segurança e Assuntos Penitenciários, Desportos e da Fiscalização e Controle.
Recentemente, tivemos uma greve de professores em São Paulo e a qualidade de ensino na rede estadual novamente entrou em pauta. A Educação também não é uma prioridade?
Lanço a partir de setembro uma importante ação na Educação, quando iremos buscar um debate junto à sociedade sobre a aprovação automática. Atualmente, o estado de São Paulo educa menos que outros estados do país. O PSDB está sucateando a Educação, os professores ficaram 92 dias em greve e o governador nem sequer os recebeu, dizendo inverdades à imprensa.
Ainda sobre a Educação, tivemos alguns casos de movimentos contrários ao combate à homofobia nas salas de aula, previsto nos planos municipais de Educação. O debate já chegou à Câmara de São Bernardo, e o prefeito Luiz Marinho defende publicamente a diversidade. Como tratar a questão no ABC e também no estado?
Acho que foi um equívoco e tenho uma opinião isolada dentro do PT sobre este debate de ideologia de gênero, pois tenho assistido no país um detrimento dos planos municipais de Educação. Religião não se discute com Educação. Como cristão, sou uma pessoa contra a intolerância religiosa. Hoje esse debate está se acirrando de tal forma na questão da homofobia, que é um absurdo que haja apologia a essa prática, e isso passou a se misturar à religião. Tenho certeza que isso é um equívoco e, como cristão, diria que o meu Deus veio ao mundo e amou. Então, é função do cristão amar o homossexual e amar ao seu próximo. Mas acredito que no caso do Plano Municipal de Educação, esse tema veio errado, num momento inoportuno.
Outro tema que entrou em pauta no Brasil, diante da escalada conservadora, é a redução da maioridade penal. Este tema passa pela Assembleia Legislativa?
Primeiramente, quero dizer a respeito dessa tramoia que ocorreu em Brasília, já que esse assunto foi debatido exaustivamente na Câmara dos Deputados e, democraticamente, os deputados federais rejeitaram a diminuição da maioridade penal. Contudo, você pega um absolutista como (o presidente da casa) Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que perdeu na votação e fez alguns arranjos para colocar a pauta novamente em votação. Defendo que o Brasil não chegue a esse ponto. Agora, o sistema prisional do Estado de São Paulo já está falido. Para se ter uma ideia, em São Bernardo, temos um CDP (Centro de Detenção Provisória) e o Ministério Público mandou soltar ou transferir presos, pois está superlotado. Então, imagine colocar jovens nesse cenário.
Já nas últimas eleições, o PT teve dificuldades no estado de São Paulo, com redução da bancada. Como organizar o partido para as próximas eleições municipais?
Em São Paulo, perdemos a eleição em todos os níveis. Perdemos a eleição para presidente, para governador, perdemos a nossa vaga no Senado e perdemos dez deputados federais e outros dez deputados estaduais. A grande verdade é que desde que um operário e trabalhador virou presidente da República houve uma inversão de valores. A classe trabalhadora chegou ao poder, mas o capital e a elite nunca aceitaram isso. O presidente Lula vem e faz uma grande distribuição de renda por meio da valorização do salário mínimo com participação direta do prefeito Luiz Marinho, na época como ministro do Trabalho, e quem pagou foi a elite. No entanto, hoje vemos grandes ladrões chamando o PT de corrupto. No mensalão (ação penal 470), prenderam companheiros nossos sem nenhuma prova e o partido não reagiu; o governo não reagiu. Erramos aí e a nossa comunicação é ruim. Somos bom de governar e ruim de nos comunicar. Temos de conversar com a base e achar uma forma de reagir, porque o que está em jogo é o nosso projeto de Brasil. Se a direita puder escravizar os negros e índios, vai fazer.
E a disputa municipal no ABC paulista?
Queremos retomar Diadema e, ao mesmo tempo, manter o PT em São Bernardo, Santo André e Mauá. Em São Caetano, queremos reeleger o prefeito Paulo Pinheiro (PMDB), pois temos sido parceiros do governo dele. Vamos debater Ribeirão Pires, se teremos candidatura própria, e em Rio Grande da Serra temos um nome forte, que é o Claudinho da Geladeira, mas o PT precisa analisar nessa cidade como vai se comportar. Há poucos dias tivemos uma reunião chamada pelo prefeito Luiz Marinho com os nossos prefeitos do ABC. Este não é momento de prévia e vontades pessoais, já que o que está em jogo é o modelo de município em 2016 e temos de estar juntos para não repetirmos erros que cometemos em algumas cidades.
E como está a definição do candidato do PT em São Bernardo?
Até o momento, só há um nome na disputa, que é o do Tarcisio Secoli (secretário de Serviços Urbanos de São Bernardo). Não existe qualquer possibilidade de haver prévia em São Bernardo, pois o meu candidato é o Tarcisio. Então as coisas convergem. De qualquer forma, não haverá crise em São Bernardo. Se o Tarcisio for escolhido candidato, vou coordenar a campanha dele, se eu for escolhido, o Tarcisio deverá coordenador a minha campanha. Somos amigos e o quero muito bem.

sábado, 25 de julho de 2015

Combate à corrupção: Desde 2003, mais de 5 mil servidores expulsos

na Rede Brasil Atual

Apesar da campanha da grande mídia para fazer parecer que o governo de PT e aliados são a gestão da impunidade, a realidade revela exatamente o contrário.

Portal Vermelho
Blog do Planalto / Flickr

Somente no primeiro semestre de 2015, o Poder Executivo Federal, ou seja, o governo da presidenta Dilma Rousseff expulsou 266 agentes públicos, sendo que 59% destes foram por casos relacionados à corrupção. A informação está contida no relatório de punições expulsivas, divulgado mensalmente pela Controladoria-Geral da União (CGU).
 
De acordo com o levantamento, em 2015 foram registradas 227 demissões de servidores efetivos, 16 destituições de ocupantes de cargos em comissão e 23 cassações de aposentadorias. Em junho foi aplicado o maior número de penalidades, com total de 81 expulsões.
 
Os dados não incluem os empregados de empresas estatais, como a Caixa Econômica, os Correios, a Petrobras, entre outras.
 
Dependendo do tipo de infração, o servidor punido não pode ocupar cargo público pelo prazo de cinco anos ou fica impedido de retornar ao serviço público nos casos mais graves. Também fica inelegível por oito anos, nos termos da Lei da Ficha Limpa.
 
Historicamente, o Ministério da Previdência Social é o líder nas expulsões, com 1.386 entre 2003 e 2015. Esse número corresponde a 3,1% da média de servidores ativos da pasta.
 
Cumprindo uma das promessas de campanha e atendendo as demandas do país, a presidenta Dilma Rousseff lançou, no começo do ano, um pacote de leis Anticorrupção que foi encaminhado ao Congresso Nacional.
 
Dilma tem reafirmado o compromisso pessoal e de seu governo em dar continuidade ao combate ao crime e salienta que, diferentemente de outros períodos, "o Brasil não varre mais a corrupção para debaixo do tapete".
 
“Combater energicamente a corrupção significa democratizar o poder. Ela rouba o poder legítimo de povo, a corrupção ofende e humilha os trabalhadores”, disse a presidenta na ocasião do lançamento.
 
 
Do Portal Vermelho, com informações de agências

sexta-feira, 24 de julho de 2015

'Educação pública precisa acertar dívida histórica com a população', diz pesquisador

na Rede Brasil Atual
1º Seminário de Educação Integral realizado em São Paulo discute até hoje perspectivas para o desenvolvimento e melhoria na qualidade do ensino
por Redação RBA
sala de aula siei
"Maior tempo na escola não pode ser mais do mesmo, e sim a ampliação das dimensões formativas", diz pesquisador

São Paulo – O pesquisador e professor do departamento de Ciências da Universidade São João Del Rei Levindo Diniz defendeu a educação integral de uma forma mais "sensível e focada na criança", em entrevista para a Rádio Brasil Atual. Ele participa do 1º Seminário de Educação Integral, realizado entre ontem e hoje (23), em São Paulo.
“A educação integral pode ser entendida tanto como a ampliação do tempo na escola, como a ampliação das dimensões formativas. Não podemos pensar em mais do mesmo”, diz. Segundo ele, a maioria dos adultos não lembra da escola positivamente. "Temos experiências que vêm rompendo com a lógica hierarquizada e autoritária, para colocar a voz da criança no centro.”
Para o pesquisador é necessário que os governos arquem com a “dívida histórica com a população desfavorecida economicamente, que não pode ser excluída na oferta de educação de qualidade a todos”.
Já para o educador popular e diretor do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD) Tião Rocha, que também participa do seminário, a educação deve ser instrumento para incluir. “É preciso olhar para a capacidade de cada lugar. Gerar acolhimento, sem deixar ninguém de fora. Conviver com diferenças e criar oportunidades”, defende.

O evento segue até as 17h30 desta quinta-feira na avenida Paulista, 2.181, Bela Vista, São Paulo.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

O Desmonte da Democracia

por José Gilbert Arruda Martins

Principalmente após a promulgação da Constituição Federal de 1988, "tornou-se costume desdobrar a cidadania em direitos civis, políticos e sociais. O cidadão pleno seria aquele que fosse titular dos três direitos" (Carvalho)


Os direitos plenos à cidadania no Brasil, são um sonho acalentado há mais de 100 anos. Apesar dos avanços da última década, somos um país ainda escravo de interesses mesquinhos de uma elite irresponsável, que aplaude com fervor a cidadania lá fora, e impõe dificuldades enormes à construção da democracia aqui dentro.

No exercício de buscar aquilo que falta ou, supostamente falta no universo intangível da macroeconomia, construindo ajustes fiscais que, novamente e historicamente, atacam apenas interesses e direitos dos trabalhadores e suas famílias, esquecemos da política de desmonte da cidadania que vem sendo operada por Eduardo Cunha (PMDB) na Câmara dos Deputados.

Quando Eduardo Cunha ainda bajulava um e outro político do Estado do Rio de Janeiro para assumir cargo na esfera pública, o país saia da Ditadura Militar e começava a construir uma Lei Maior digna de ser elogiada no que concerne às questões sociais. Pelo menos na lei estávamos bem servidos. A Constituição Cidadã de 1988 é repleta de passagens em artigos que contemplam a liberdade e o amparo social:

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão

Levamos cerca de vinte e cinco anos, no período pós Constituição de 1988, na construção de um arcabouço legal que amparasse a cidadania que, em apenas cinco meses como presidente da Câmara dos Deputados, o Sr. Eduardo Cunha está, implacavelmente, pondo a baixo.


Quem perde é a cidadania, a democracia, não apenas os mais pobres, aliás, toda a sociedade perde. As medidas de desmonte capitaneada por Cunha e sua tropa, não irão diminuir a violência, a tendência é o seu recrudescimento. Porque retira direitos e impede as camadas mais frágeis da sociedade de alcançá-los.

A construção da cidadania formal no país - Leis e Políticas Públicas -,durante muito tempo foi esquecida pelo poder hegemônico e pelo Estado controlado e dirigido por esse poder.

Nem mesmo a Constituição de 1934, que inicia no Brasil, a construção de uma base legal um pouco mais voltada para o social, teve vida suficiente para estruturar e construir um mínimo de leis e políticas públicas voltadas para a maioria.

A Casa Grande foi preferida e privilegiada em praticamente 100% das ações do Estado brasileiro até a constituição de 1988.

Um exemplo muito ilustrativo é que a suposta crise não atinge os mais ricos ou a alta classe média; a imprensa divulgou dias atrás a expansão nas vendas de apartamentos e carros de luxo.

Portanto, a cidadania aos "homens bons" já foi mais que consolidada. Praticamente todas as políticas públicas ou privadas no que se refere à moradia, renda, formação, lazer, cultura etc., foram direcionadas, por mais de cinco séculos a essas classes sociais. Enquanto a maioria da sociedade foi quase que completamente preterida.

A construção de leis e políticas públicas voltadas à cidadania, foi concretamente iniciada com a Constituição Federal de 1988 e, dada continuidade, nos governos trabalhistas de Lula da Silva e Dilma Roussef, no início dos anos 2000.

Nos anos imediatamente após a promulgação da Constituição de 1988, conseguimos forjar a partir da luta dos Movimentos Sociais organizados, um conjunto de leis importantes, entre elas o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n° 8.069/1990.

O Brasil serve de modelo para o mundo no que se refere a algumas leis, e o ECA é um exemplo disso.

Antes dessa lei importante, nossas crianças, adolescentes e jovens, fundamentalmente os filhos e filhas de trabalhadores, eram "amparados" ou no velho Código Melo Matos de 1927 e, principalmente no Código de Menores de 1979, que o ECA revogou.

Tanto um como o outro, tratavam crianças, adolescentes e jovens como cidadãos de segunda classe; esses grupos sociais importantes eram denominados de "Di Menor", "vagabundos", "meninos de rua", "trombadinhas", "menino carente", "menor abandonado".

Esse tratamento, que de uma certa forma é oriundo do regime escravocrata, solidificou na sociedade a cultura da violência contra os filhos e filhas de pobres, principalmente se é negro e reside na periferia.

Quando o ECA - Estatuto da criança e do adolescente - entrou em vigor, na década de 1990, essa realidade começou a sofrer uma importante mudança. pela primeira vez, deixava-se bem claro que meninos e meninas são sujeitos e não objetos, com direitos e deveres expressos em lei.

"O ECA é resultado da celebração e ânsia pela construção de um sistema de direitos. Ele leva a marca inconfundível da participação popular. Seu conteúdo tem origem nas praças, nas ruas, nas igrejas (progressistas)".

Além do ECA, que é uma lei moderna, progressista, o Brasil é signatário de Tratados Internacionais importantes na seara dos Direitos Humanos, entre eles, a "Declaração de Genebra dos Direitos da Criança" de 1929; da "Convenção Interamericana de Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica" de 1969 e da "Regras Mínimas para a Administração da Justiça de Menores - Regras de Beijing", todas ratificadas por nosso país.

Mas, os avanços legais que vieram com a "Constituição Cidadã", como a denominou Ulisses Guimarães, não foram capazes de conter na década de 1990, mais precisamente a partir de 1995, o desmonte do Estado patrocinado por Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que iniciaram a implantação da política econômica de orientação neoliberal, causando o sucateamento perverso e premeditado de quase tudo que era público e voltado ao atendimento dos interesses sociais.

Os governos neoliberais de Collor e FHC, preocupados em desmontar o Estado, consequentemente atingiram em cheio os setores mais pobres da sociedade, na década de 1990, o país tinha cerca de 50 milhões de famintos e miseráveis, a educação pública foi esquecida, e teve seu aspecto quantitativo e, principalmente qualitativo fortemente atingido e depauperado.

Apesar desse período nefasto, muito do arcabouço legal dado pela nova constituição se manteve e, no início dos 2000, o Estado brasileiro voltou-se novamente para o social, com a ascensão ao poder de governos trabalhistas na figura de Luis Inácio Lula da Silva que retomou e ampliou as Políticas Públicas voltadas à construção ou reconstrução democrática e cidadã.






Estatudo da Criança e Adolescente, 25 anos depois

POR LAIS FONTENELLE PEREIRA no Outras Palavras
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Na vigência do ECA, caiu mortalidade infantil, avançaram escolarização e acesso à saúde preventiva. Mas violência contra jovens explodiu — e agora, eles podem pagar de novo por isso
Por Lais Fontenelle
A infância tem sido encurtada e roubada diante de nossos olhos. Ao longo dos 25 anos de criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), completados neste 13 de julho, embora tenha havido conquistas, Estado e sociedade não têm cumprido seu papel na garantia dos direitos das crianças e adolescentes. Principalmente na proteção contra todas as formas de negligência, exploração, violência, crueldade e opressão, como impõe o artigo 227 da Constituição Federal.
O maior motivo de comemoração, na verdade, está nesse artigo da “Constituição Cidadã”, que marca o reconhecimento das crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Ele prevê que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.” Inaugura assim a doutrina da proteção integral da criança – além do conceito de prioridade absoluta da infância.
O ECA é seu desdobramento, e a partir de sua promulgação as crianças perderam sua invisibilidade social e ganharam um novo status. O que falta então? Efetividade ou o próprio entendimento da lei? Ou é uma questão ética e moral? Talvez o que falte seja a sociedade civil reconhecer crianças e adolescentes como seres vulneráveis – que experimentam fase peculiar de desenvolvimento e, por isso, precisam ser protegidos e resguardados. A infância é o período decisivo na formação da personalidade, dos valores e do desenvolvimento físico, cognitivo e emocional das crianças – que podem ser o prefácio de um mundo mais ético, justo e sustentável dependendo da forma como são olhadas e escutadas/ tratadas.
Olhando em retrospectiva para os direitos da infância em nosso país, podemos dizer que muitos avanços foram conquistados, passando pela queda expressiva na taxa de mortalidade infantil à matrícula de quase 100% das crianças no ensino fundamental. Vacinação, atendimento à saúde e alimentação foram garantidas com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e programas como o  Bolsa Família. No entanto, ainda não conseguimos, infelizmente, que os jovens deixassem de ser alvo de mortes violentas. Muito pelo contrário. Dados recentes do Fundo das Nações Unidas pela Infância (Unicef) indicam que o número de assassinatos de crianças e adolescentes até 19 anos passou de 5 mil para 10,5 mil por ano – são 28 por dia e transformam o Brasil em vice-campeão mundial no assassinato de jovens, só atrás da Nigéria.
Nos últimos anos, aconteceram muitos retrocessos em relação a direitos já conquistados – a começar pela pauta da redução da maioridade penal que, pasmem, dividiu opiniões e foi à votação através da emenda constitucional da PEC171/93, que reduz para 16 anos a idade penal. A proposta foi apresentada como solução para os problemas de segurança pública alegando, erroneamente, que a “impunidade” dos adolescentes era a causa dos altos índices criminais do país. A discussão toda foi descabida, principalmente por ferir o princípio positivado no artigo 60, §4, IV da Constituição, que veda o retrocesso em matéria de direitos fundamentais.
Segundo Guilherme Perisse, advogado do projeto Prioridade Absoluta do Instituto Alana, a PEC, assim como aqueles que votaram a seu favor, parecem desconhecer que levariam aos desumanos cárceres brasileiros adolescentes muitas vezes vítimas de sucessivas violações, o que não só contraria os direitos das crianças e adolescentes, mas em nada resultará na redução dos índices criminais. Mais violência não é solução. O caminho a ser seguido deveria ser exatamente o inverso, diz ele: “Assegurar os direitos previstos no texto constitucional e na legislação de forma a permitir o pleno desenvolvimento das crianças e adolescentes.”

“Brincar é solução, redução não”
Meu desejo é de que um novo ciclo com foco na defesa dos direitos de nossas crianças seja efetivo e compartilhado por todos: família, sociedade, mercado e Estado. E a resposta de que isso é tão possível quanto urgente foi a mobilização “Juntos pelo Brincar”, que aconteceu dia 5 de julho no Largo da Batata, Zona Oeste de São Paulo. Depois de inúmeras reuniões, conversas e articulações para garantir um dia memorável, com diferentes atrações para as crianças, a mobilização trouxe esperança ao domingo mais frio do ano, quando o espaço público se tornou palco de diversas atividades lúdicas propostas por organizações da sociedade civil que defendem os direitos das crianças e trabalham para promovê-los, ali reunidas para celebrar o ECA.
Bambolê, bicicleta, corda, leitura de livros, pintura, trepa-trepa, troca de brinquedos e muitas outras atividades se espalharam pelo largo, unindo adultos e crianças em torno da mesma causa: fazer valer os direitos de nossas crianças e adolescentes. A mobilização “Juntos pelo Brincar” contou com o apoio da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo e da Subprefeitura de Pinheiros, mas foi construída de forma coletiva e horizontal com base em três eixos importantes garantidos pelo ECA. O direito ao brincar, fundamental no desenvolvimento da criança e do adolescente; o direito à convivência familiar e comunitária como forma de inserção no meio social para que eles interajam com o mundo de maneira saudável e segura; e o direito ao espaço público para encorajar as crianças e adolescentes a se reconhecerem como cidadãos e sujeitos de direitos.
O dia conseguiu mostrar que “Brincar é solução, redução não” de forma leve e lúdica. Que nos próximos anos, aconteçam mais manifestações coletivas em prol das crianças e do brincar, com cada vez mais pessoas e organizações empenhados em fazer valer os direitos das crianças e dos adolescentes. E que as crianças sejam ouvidas em seus direitos, principalmente o de ter infância. Não façamos o convite para que elas cresçam antes do tempo.
Que nos próximos 25 anos possamos honrar mais as crianças e que a maioria da população consiga entender que a culpabilização dos adolescentes, verificada nas propostas de redução da maioridade penal aprovada pela Câmara dos Deputados, é um retrocesso que não vai resolver o problema da violência no Brasil, mas, antes, agravá-lo. A solução para reduzir a violência é um maior investimento nas crianças e adolescentes. Devemos fazer valer o que está previsto no artigo 227 de nossa constituição Federal e no ECA, mostrando que a regra da prioridade absoluta não está sendo cumprida. Só assim chegaremos a alcançar uma sociedade mais digna, justa e igualitária para as crianças e adolescentes.

Lais Fontenelle Pereira

Lais Fontenelle Pereira, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio e autora de livros infantis, é especialista no tema Criança, Consumo e Mídia. Ativista pelos direitos da criança frente às relações de consumo, é consultora do Instituto Alana, onde coordenou durante 6 anos as áreas de Educação e Pesquisa do Projeto Criança e Consumo.



quarta-feira, 22 de julho de 2015

Gulabi Gang, autodefesa indiana contra o machismo

no Outras Palavras
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Num país com altíssimo índice de violência de gênero, um grupo de 270 mil mulheres exige respeito, dirime conflitos e dissuade, com seus grandes bastões, mais espancamentos 
Por Luis A. Gómez, no Opera Mundi
Em uma região cheia de histórias, entre o Taj Mahal e a milenária cidade de Varanasi, milhões de mulheres têm sido espancadas, humilhadas e caladas à força no estado hindu de Uttar Pradesh. Ali, a violência contra mulheres no âmbito doméstico ultrapassa a média nacional da Índia (38% das mulheres sofreram algum tipo de abuso físico ou sexual, de acordo com a Terceira Pesquisa Nacional Sobre Saúde Doméstica, de 2006). Quase metade dos homens confessou ter abusado sexualmente de sua esposa alguma vez.
No distrito de Bandha, no sul do Estado, as taxas são as mais altas. Mas não foi assim na comunidade de Atarra, onde Sampat Pal Devi, casada aos 12 anos de idade com um amável vendedor de sorvetes e mãe aos 15 anos, um dia decidiu “devolver o favor” ao marido abusivo de uma conhecida.
Quando tinha 16 anos, Sampat viu um homem espancando sua esposa em Atarra. Pediu ao homem que parasse, mas não conseguiu. No dia seguinte, acompanhada de um grupo de mulheres que conseguiu reunir, bateu no homem. Isso aconteceu em 1980 e foi o começo de um movimento que inspira mulheres em todo o mundo.
Hoje com 51 anos, ela comanda pouco mais de 270 mil mulheres vestidas com saris rosas e armadas com lathis (bastões de madeira de um metro e meio de comprimento). O grupo, conhecido como Gulabi Gang (Gangue de Rosa), a segue por todas as partes, mediando conflitos domésticos, arrumando casamentos, denunciando a corrupção de burocratas e, se necessário, usando lathis para revidar abusos.
“Normalmente prefiro usar a razão”, afirma Sampat. “É melhor convencê-los a fazer o correto. Quase nunca tivemos de chegar a usar a violência”. De toda forma, a Gulabi Gang se organiza quase militarmente (com comandantes e muitas sessões de treinamento para a autodefesa). E, desde 2006, usam como uniforme o sári cor-de-rosa (na verdade, magenta). Mas não é uma referência particular à feminilidade. “Queríamos ter algo que não tivesse relação com os partidos [políticos] e nenhum usa rosa. Por isso escolhemos essa cor”, explica sem pressa Pal Devi.
Justiceiras ou necessárias?
Elas foram acusadas de justiceiras, de fazer justiça com as próprias mãos. E o comando onipresente de Sampat foi criticado muitas vezes. Entretanto, em Uttar Pradesh é complicado confiar na polícia, definida por um juiz da Corte Superior de Distrito do Estado como “a maior organização criminosa do mundo”. De toda forma, explica Sampat, as mulheres da Gulabi Gang querem estar “do lado luminoso da lei”, mesmo que seja forçando os agentes a cumpri-la.

Nem tudo se resume a um grupo de autodefesa. Algumas doações começaram a ser usadas para outras atividades. Em 2010, as mulheres de rosa criaram uma escola para os filhos das castas mais baixas e os povos indígenas do país. Sampat quer que a nova geração tenha uma educação melhor do que à que ela teve acesso, tendo de aprender sozinha a ler e a escrever. “As mulheres das comunidades têm de estudar e se tornar independentes para decidir suas vidas”, disse ao The Guardian na ocasião.
Sampat treina combatente do grupo em cena do documentário “Gulabi Gang”
Em sua luta para evitar matrimônios infantis, capacitam jovens a usar máquinas de costura. Assim, transformadas em trabalhadoras autônomas, produzem dinheiro e seus pais não querem que se casem, pelo menos não antes dos 16. Também existe o negócio de pequenos pratos feitos com folhas de árvore, que Prema Rambahori organizou com apoio da Gulabi Gang em um território salpicado de pequenas comunidades indígenas. Populares em festas e bodas, os pratos dão trabalho, hoje, a mais de 200 mulheres diariamente.
Claro que Sampat e suas companheiras são mais notórias visitando casas e resolvendo injustiças. Como a boda negada em um pequeno povoado muçulmamo onde Sampat, por horas, discutiu os pormenores do compromisso a pedido da noiva. “Sampat nunca é injusta. Sampat não maltrata sem motivo. Venham falar comigo”, disse a comandante ao chegar. Ela permaneceu até que se realizou o casamento com a aprovação das autoridades comunitárias, ao fim do dia, comovendo o pai da menina a aceitar todas as condições.
Sampat Pal Devi / Foto: Divulgação
Sampat Pal Devi / Foto: Divulgação
Como sua ação é notória em todo o mundo, a Gulabi Gang tem sido objeto de estudo e de documentários. No entanto, a fama trouxe tensões internas e, em março de 2014, Sampat foi suspensa como comandante-em-chefe por participar de uma eleição para deputada em 2012 (está proibida de trabalhar com partidos políticos segundo o regulamento interno) e por não prestar contas das doações e de suas viagens constantes.
Nesse período, Sampat declarou à imprensa: “As acusações contra mim não têm fundamento e eu responderei a elas… Tenho sido uma lutadora e vou superar isso também.”
Depois de um processo interno que demorou meses, Sampat Pal Devi foi restituída a seu cargo e começou outra etapa na vida da Gulabi Gang. Desde então, o grupo começou a expandir suas atividades para outras regiões de Uttar Pradesh e para o estado vizinho de Madhya Pradesh. De fato, começaram a criar núcleos do grupo em várias cidades.
Em janeiro deste ano, durante sua visita a Odisha, estado da costa leste, Sampat afirmou em uma conferência que sua intenção é “logo expandir a rede para outras partes da Índia”. A comandante explicou as razões: “a missão da gangue é erradicar os males sociais e questionar o sistema de castas, dar poder às mulheres e lutar pelos direitos dos pobres.”
No início de junho, uma decisão da justiça indiana teve um gosto especial para Sampat: Purushottam Naresh, um ex-deputado nacional acusado de estupro em 2010, foi sentenciado por seus abusos. Foram Sampa e seu grupo que pressionaram para conseguir que Dwivedi fosse formalmente acusado. A dirigente da Gulabi Gang foi candidata nas eleições contra ele. Perdeu nos votos, mas não na justiça. Dwivedi passará 10 anos preso. Sampat falou pouco com jornalistas depois da sentença. Mas foi vista sorrindo sem pressa, rodeada de outras mulheres, cantando: “como a maré do oceano, há uma maré rosa.”