sábado, 17 de setembro de 2016

YVYRUPA - Assembleia Guarani pede demarcação, educação e saúde para indígenas

 Rede Brasil Atual

Além da reivindicação por direitos sociais básicos, índios também manifestaram preocupação com retrocessos do governo Temer

por Bruno Bocchini, da Agência Brasil

Yvyrupa
'Temos preocupação com a mudança de governo, que passemos a ter dificuldades com questões já garantidas'

São Paulo – A 7ª Assembleia da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), que reúne lideranças políticas e espirituais da etnia Guarani das regiões Sul e Sudeste do país, aprovou ontem (15) manifesto em que reivindica demarcação de terras e elenca propostas para melhoria da educação e saúde dos indígenas. O documento será divulgado hoje (16). A assembleia está ocorrendo desde segunda-feira (12), na aldeia Tenondé Porã, em Parelheiros, zona sul de São Paulo.
“Estamos preocupados com projetos de lei e de emenda à Constituição que estão no Congresso Nacional, como a PEC 215 (que transfere do Executivo para o Legislativo a decisão final sobre a demarcação de terras indígenas). Estamos discutindo também sobre território, educação, e demarcação de terras indígenas Guarani na faixa litorânea no Sul e no Sudeste”, disse o coordenador geral da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), Marcos Tupã.
Entre outras demandas, a comissão reivindica saneamento básico e água tratada para as aldeias e uma política oficial, formalizada, para a criação de escolas indígenas e formação de professores no estado do Rio de Janeiro. Também pede a demarcação, reconhecimento territorial e homologação de terras indígenas como as do Rio Silveiras, em São Sebastião (SP), e do Morro dos Cavalos, em Santa Catarina.

“Temos preocupação com a mudança de governo, que passemos a ter dificuldades com todas as questões que já são garantidas. Com esse cenário nacional, com o agronegócio, cada vez mais poderemos ter dificuldades, principalmente com esse projeto em pauta, que é a PEC 215”, disse o coordenador.

sábado, 10 de setembro de 2016

SC - Falta de laudo antropológico atrasa regularização fundiária de quilombo no Rio Vermelho

no Observatório Quilombola

Reconhecida pela Fundação Cultural Palmares desde 2013, a comunidade quilombola Vidal Martins terá que esperar mais algum tempo pela regularização fundiária do território ocupado entre os séculos 18 e 19, por descendentes de escravos trazidos da África, como mão de obra para a colonização do distrito de São João do Rio Vermelho, Leste de Florianópolis. O Incra (Instituto Nacional de Reforma Agrária) não aceitou o laudo elaborado pelo departamento de antropologia da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), concluído em maio deste ano. O relatório recusado é resultado de acordo de cooperação técnica  assinado um ano antes entre as duas instituições, que já perdeu a validade.

Odílio Vidal, Helen e Jucelia Vida, no quilombo Vidal Martins, no Rio Vermelho - Bruno Ropelato
Maicon, o pai Odílio Vidal, Helen e Jucelia Vidal representam a comunidade quilombola Vidal Martins, no Rio Vermelho - Bruno Ropelato

No Incra, o relatório antropológico é a primeira etapa necessária para abertura do processo de regularização de territórios quilombolas com certidão de autorreconhecimento expedida pela Fundação Cultural Palmares. É este documento que caracteriza a comunidade sob as perspectivas históricas, econômicas, socioculturais e ambientais, e fornecer dados técnicos para o  RTDI (Relatório Técnico de Delimitação e Identificação).

O relatório elaborado pela equipe interdisciplinar da UFSC, entregue oficialmente ao Incra no dia 11 de maio deste ano, foi considerado incompleto. O documento foi avaliado por antropólogo do Incra, que, um mês depois do recebimento, solicitou à equipe responsável a realização de pesquisas  complementares para elaboração de outro laudo.

O parecer técnico do Incra, segundo a superintendência do órgão em Santa Catarina, é confidencial. Enquanto na comunidade predomina o sentimento de insegurança e dúvidas, o Ministério Público Federal em Santa Catarina passou a intermediar as negociações entre UFSC e Incra, para retomada do processo e complementação do relatório. A expectativa é de renovação do acordo de cooperação técnica entre os órgãos pelo menos até 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra e de Zumbi dos Palmares.

Sem laudo, sem plano diretor

A falta do laudo antropológico inviabiliza a demarcação e o mapeamento do território quilombola do Rio Vermelho no Plano Diretor da cidade, como “patrimônio público e cultural da cidade”. O processo está paralisado no Ipuf (instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis), suspenso enquanto não for elaborado novo relatório oficial para regularização fundiária.

Sem o laudo antropológico, a comunidade também fica excluída do plano de manejo do Parque Florestal do Rio Vermelho, administrado pela Fatma (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Enquanto esperam resignados, cerca de 50 descendentes de Vidal Martins ocupam área de 300 metros quadrados, às margens da rodovia João Gualberto da Silveira, na localidade do Porto.

É lá de Odílio Martins, 66, montou pequena quitanda para vender frutas e verduras à vizinhança. “Sempre vem alguém comprar alguma coisa. É pouco, mas ajuda a aposentadoria”, diz o velho quilombola, ainda com disposição para pescar tainhotas, siris e camarões.

“Cresci na beira da lagoa. Atravessar a nado ou com lama pela barrida até o outro lado era a nossa melhor brincadeira”, diz. Odílio começou a trabalhar cedo, ao lado do pai, Izidro, e participou do plantio das primeiras mudas de pinus que dominam a restinga da Praia Grande [Moçambique], na década de 1970. Sob as ordens do engenheiro Florestal, Henrique Berenhauser, descendentes de Vidal Martins também abriram a picada para a estrada entre Rio Vermelho e Barra da Lagoa.

Avó de Vidal Martins veio da África

Filho de Joana e pai desconhecido, neto de Jacinta, negra trazida da África em meados do século 18, Vidal Martins morreu em 1910, aos 65 anos. Conforme pesquisaram as bisnetas Shirlen e Helena Oliveira, Vidal era bebê quando Joana passou a servir ao padre Antônio Mendes Pulcheria Mendes de Oliveira, primeiro residente da Paróquia de São João Batista do Rio Vermelho.

O mesmo padre, em 1850, a casou com Manoel Fonseca do Espírito Santo, escravo do tenente coronel Antonio José Diniz.  Libertos, tiveram 13 filhos. Todos batizados e registrados na paróquia do Rio Vermelho, conforme certidão emitida pelo Museu da Cúria Metropolitana de Florianópolis.